segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Tecnologia Não Voa

Os ataques de 11 de setembro de 2001 mudaram praticamente tudo, principalmente as viagens aéreas. Desde aquele dia o governo americano tem gasto bilhões em tecnologias, aprovado uma quantidade enorme de decretos sobre novas regras e tornado os voos um procedimento desnecessariamente preocupante e complicado.
Se tudo se baseasse na ciência e na razão os críticos não precisariam chamar esses novos procedimentos de “teatro da segurança” – um espetáculo exagerado para convencer as pessoas de que as autoridades estão fazendo alguma coisa, para não dizer nada.

Vejamos as regras da Administração de Segurança de Transportes (TSA, na sigla em inglês) sobre o transporte de produtos eletrônicos, por exemplo. Laptops devem ser transportados fora da bagagem de mão e depositados numa bandeja de plástico – mas isso não vale para tablets, Kindles, telefones, câmeras e consoles de videogames portáteis. Por que essa distinção?

A TSA explica que não se trata apenas de detectar explosivos: retirar aparelhos eletrônicos grandes desatravanca a bagagem de mão para facilitar a análise por raios X. Mesmo assim, de um ponto de vista rigoroso, as regras tornam-se arbitrárias muito rapidamente. De acordo com a TSA, por exemplo, o modelo de 11 polegadas do MacBook Air pode ser mantido na bagagem de mão, mas o modelo de 13 polegadas precisa ser retirado.

Depois há os postos de checagem nos aeroportos, onde os velhos detectores de metais estão sendo substituídos por escâneres de ondas milimétricas e de retroespalhamento. Acredita-se que esses instrumentos sejam capazes de detectar armas não metálicas e outros produtos contrabandeados – e não apenas objetos metálicos. Muitas pessoas consideram essas máquinas invasivas (podem ver através das roupas), de custo muito alto e, no caso das máquinas de retroespalhamento, uma potencial fonte de risco de câncer.

Elas exigem também o dobro de funcionários para operá-las e muito mais preparação dos passageiros (não se pode ter nada nos bolsos: nem carteira, nem cartão de embarque). Além disso, são muito mais lentas – segundo a TSA as varreduras levam “menos de um minuto”, mas isso representa um tempo 60 vezes maior que o necessário para cruzar o portal de um detector de metais. Por isso, alguns aeroportos estão sugerindo que o check-in de voos domésticos seja feito com duas horas de antecedência. Em consequência, quantos milhões de dólares em produtividade estão sendo perdidos?
Com essas máquinas trocamos conveniência por segurança. Mas observem: se formos adaptar uma política de “segurança pela conveniência a qualquer custo”, por que não proibir todas as bagagens e exigir que os passageiros viajem nus? Finalmente, há uma norma da Administração Federal de Aviação (FAA, na sigla em inglês) de que todos os aparelhos eletrônicos, até fones de ouvido e leitores de livros eletrônicos, precisam ser desligados durante o pouso e a decolagem, sob a alegação de evitar interferência com sistemas de navegação do avião.

Mas as evidências científicas para essa regra não são conclusivas. Alguns dispositivos emitem sinais que, teoricamente, poderiam afetar a eletrônica da aeronave. No entanto, “nunca houve acidentes relatados devido a esse tipo de aparelhos em aviões”, declarou o porta-voz da FAA, Les Dorr, ao New York Times no ano passado. Mais uma vez, o medo irracional e não a ciência séria está ditando políticas para milhões de passageiros.

Minha área é tecnologia, por isso realmente não deveria discutir o disparate das regras da TSA. Isso sem mencionar o fato de que ninguém poder carregar mais de 100 ml de líquido num frasco, mas você (e o grupo com quem está) pode trazer vários desses pequenos frascos. Ou como você tem permissão de levar um recipiente cheio de líquido se disser que é uma fórmula aviada para o bebê. Ou que você precisa jogar fora um tubo de pasta de dente de 200 g mesmo que ele esteja 80% vazio. Ou por que crianças de 12 anos ou menos não precisam mais tirar os sapatos.

Ou como tudo isso é canalizado para a prevenção de um ataque terrorista num avião com 100 pessoas – enquanto praticamente nenhuma atenção é dispensada para alvos muito mais populosos como estações de trem, teatros, estádios esportivos e, sim, até aeroportos.

A TSA tem uma boa noção de sua imagem pública e está se esforçando para introduzir algumas medidas que possam melhorar a movimentação dos passageiros. Escâneres de aeroportos não enviam mais imagens que despem as pessoas para um dispositivo externo (atualmente um software faz a análise). E o programa de check-in antecipado (atualmente adotado por várias empresas aéreas e 15 aeroportos, com outros aderindo) oferece aos passageiros de baixo risco uma fila especial, onde tirar os sapatos e casacos não é mais necessário.

Em resumo, as meias-medidas irracionais da TSA e políticas eletrônicas obsoletas não nos protegem tanto de terroristas. O que elas realmente fazem é infernizar a vida dos passageiros.

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