quinta-feira, 13 de novembro de 2014

O ódio atrás das grades: da construção social da discriminação por orientação sexual à criminalização da homofobia



El odio tras las rejas: de la construcción social de la discriminación por orientación sexual a la penalización de la homofobia

Hate Behind Bars: from the construction of sexual orientation as basis for discrimination to the criminalization of homophobia


Lucas FreireI; Daniel CardinaliII
IGraduando do 8º período em Ciências Sociais - Universidade do Estado do Rio de Janeiro >lucas.mfreire@hotmail.com
IIGraduando do 9º período em Direito - Universidade do Estado do Rio de Janeiro> danielcardinali@hotmail.com



RESUMO
O presente artigo pretende analisar como a criminalização da homofobia tornou-se pauta fundamental das lutas nacionais pelos direitos LGBT. É realizada uma revisão do significado histórico e cultural de se ter relações sexuais com pessoas do mesmo sexo no Brasil. Parte-se das categorias sodomitauranista e homossexual até a construção de uma identidade homossexual que permite a organização de um movimento social com bandeiras políticas próprias. Em seguida, discute-se o conceito de homofobia, entendida como uma espécie de discriminação. Por fim, são abordados os argumentos que legitimam a tutela penal, a partir de uma análise da dogmática jurídico-constitucional sobre o tema; a necessidade, a efetividade e as possibilidades deste tipo de medida; os projetos de lei já existentes; e as diferentes críticas que buscam rechaçá-los.
Palavras-chave: homofobia; criminalização; homossexualidade; direitos LGBT; Brasil

RESUMEN
El artículo analiza cómo la  penalización de la homofobia se ha convertido en un tópico central de la lucha por derechos LGBT en el Brasil. Se presenta una revisión del significado histórico y cultural de tener relaciones sexuales con personas del mismo sexo; partiendo de las categorías sodomitauranista y homosexual, para llegar a la construcción de una identidad homosexual que ha permitido la constitución de un movimiento social con banderas políticas propias. Además, se discute el concepto de homofobia, entendida como un tipo de discriminación. Se abordan, por último, los argumentos que legitiman esta tutela penal, a partir de un análisis de la dogmática jurídico-constitucional sobre la cuestión; la necesidad, efectividad y posibilidades de medidas de este tipo; los proyectos de ley existentes, y las diversas críticas con las que se intenta rechazarlos.
Palabras clave: homofobia; penalización; homosexualidad; derechos LGBT; Brasil

ABSTRACT
This article analyzes how the criminalization of homophobia became the main agenda in a national struggle for LGBT rights. The historical and cultural meaning of same-sex relations in Brazil, from categories such assodomiteuranist and homosexual to the emergence of a homosexual identity, led to the organization of a social movement with an agenda of its own. Homophobia is understood as a form of discrimination. This article is a constitutional theory contribution to the analysis of the arguments in favor of criminal protection, addressing its necessity, effectiveness and possibilities, current bill proposals, and their critiques.
Keywords: Homophobia; Criminalization; Homosexuality; LGBT rights; Brazil



Introdução
Historicamente, a homossexualidade figurou como questão de interesse para diversas instâncias da sociedade em momentos diferentes. Já foi considerada um pecado no campo da teologia; um crime no âmbito jurídico; uma doença e um desvio psicológico para a medicina. Deste modo, a homossexualidade foi rechaçada e condenada de diferentes formas até alcançar o seu atual status de "orientação sexual" equiparada à heterossexualidade. Tal mudança de paradigma permitiu aos homossexuais ingressarem no debate político em busca de seus direitos como sujeitos legítimos.
Embora o Poder Legislativo pareça o destinatário natural dessas demandas no Brasil, ele tem permanecido refratário quanto à defesa dos direitos de minorias sexuais, o que levou, então, à busca pelo Poder Judiciário. Assim, configurou-se uma tensão entre os dois poderes: o Judiciário brasileiro vem sendo acusado de promover um ativismo judicial exacerbado, que transgride os limites de sua própria competência, atuando como legisladorde facto.
Em que pesem as conquistas1 recentes do movimento LGBT junto ao Judiciário, um de seus principais anseios, o de criminalização da homofobia, somente pode ser contemplado pelo Poder Legislativo, em função do princípio da legalidade. Contudo, diante da força da chamada bancada evangélica, a aprovação de uma lei neste sentido parece distante e a discussão no Congresso Nacional entre opositores e defensores de tal projeto tem sido marcada pelo extremismo. Deve-se, entretanto, buscar uma abordagem laica acerca do tema, tendo em vista a sua importância para a efetivação do projeto de uma sociedade igualitária, conforme previsto na Constituição. É no intuito de contribuir para tal debate que este artigo pretende apresentar o modo como as demandas do movimento homossexual brasileiro evoluíram; os argumentos contrários e os favoráveis à criminalização; e os projetos de lei existentes neste sentido.

1. Homossexuais: pecadores, criminosos, anormais, atores políticos2
A atual concepção de homossexualidade é fruto de uma construção histórica e cultural, tendo como atributo essencial o interesse sexual por pessoas do mesmo sexo. Uma ampla gama de campos do conhecimento produziu discursos, quase sempre estigmatizantes, sobre os homossexuais. Através de um leque de mecanismos de poder, já foram chamados de sodomitas, uranistas, pederastas etc., e tratados como pecadores, criminosos e doentes.
1.1 Os pecadores sodomitas
No Brasil, a primeira palavra utilizada para se referir a indivíduos que mantinham relações sexuais com pessoas do mesmo sexo foi sodomita. A nomenclatura advém dos ensinamentos cristãos, nos quais a sodomiacaracteriza as relações sexuais contra a natureza humana, em especial o sexo anal. A expressão é uma referência à cidade de Sodoma que, de acordo com a Bíblia, era um local de depravação moral onde ocorreriam as mais perversas práticas sexuais (Trevisan, 2011). Desta forma, os sodomitas cometiam o chamado "pecado nefando", ou seja, aquele que não podia nem mesmo ser mencionado. Tal horror era provocado pelo fato de as relações sodomíticas não cumprirem a função de reprodução.
Ao levar em consideração tal contexto, não é de se estranhar que, além de pecado, a homossexualidade fosse também um crime. Assim, desde os primeiros dias do Brasil Colônia, a homossexualidade foi criminalizada pelas Ordenações Portuguesas – principalmente pelas Ordenações Filipinas, que vigoraram por mais de 200 anos, mesmo após a independência (Pretes & Vianna, 2008; Rios, 2002).
sodomia era considerada uma ofensa ao Estado e equiparada ao crime de lesa-majestade, cuja punição era a morte. Isto torna evidente a articulação entre os saberes religioso e jurídico na produção de uma categoria estigmatizada de indivíduos, de modo que aqueles que nela se enquadrassem seriam considerados seres inferiores e indignos.
De acordo com Trevisan (2011), em que pese a frouxidão moral das práticas sexuais dos primeiros tempos coloniais, muito em função dos costumes dos nativos alheios à moral sexual europeia e dos degredados condenados por todo tipo de delito religioso e carnal que a metrópole aqui despejava, a influência da Igreja e da Coroa logo se fez sentir. De acordo com Mott (2000), preocupada em manter um rígido controle dos costumes na colônia no contexto da contrarreforma, a Inquisição portuguesa realizou diversas visitações à colônia,3 tendo tais incursões resultado na punição exemplar dos praticantes do coito sem fim reprodutivo, especialmente com membros do mesmo sexo. O caráter especial destes crimes pode ser percebido pela ausência de previsão de abrandamento da pena em função do status social, aspecto que existia para outras condutas punidas.
1.2 Homossexualismo: uma psicopatologia
A partir do século XIX, as teorias positivistas fizeram com que a ciência passasse a buscar a "verdade sobre o sexo", institucionalizando o que Foucault (2011) chama de scientia sexualis. Através de relatos detalhados sobre práticas sexuais, era possível apreender o "real caráter" de um sujeito. Surge então o termo homossexual, cunhado pelo médico Karl Maria Kartbeny (Trevisan, 2011; Costa, 1992). Com isso, a relação entre pessoas do mesmo sexo é designada de homossexualismo e adquire um caráter patológico, uma vez que se desvia da heterossexualidade, a única expressão sexual apontada como útil pela ciência, respaldada no discurso sobre reprodução e sobre a diferença incomensurável (Laqueur, 2001) entre os sexos.
Nesse contexto, a homossexualidade deixa de ser tutelada pela ordem jurídica e torna-se objeto da medicina, principalmente do campo da saúde pública. Um processo seminal de descriminalização da homossexualidade no Brasil se dá com a entrada em vigor do Código Criminal de 1830, que não mais previa o crime de sodomia, desde que a prática ocorresse entre adultos, com consentimento e sem incidência pública. Entretanto, Pretes e Vianna (2008) apontam a permanência de uma "criminalização indireta", já que as práticas homossexuais eram enquadradas como "ato obsceno" e/ou "atentado ao pudor" pelos policiais. Estes eram vistos como responsáveis pela manutenção da "moral pública" e dos "bons costumes", claramente baseados na ordem heteronormativa.
Green e Polito (2006) ressaltam que essa "criminalização indireta" persistiu no Código Penal de 1890, uma vez que a linguagem genérica e abstrata utilizada em seus artigos podia ser facilmente usada em desfavor de homossexuais trazidos à justiça.4 Ademais, é interessante notar que o uso de roupas e adereços do sexo oposto – o travestismo – constituía tipo penal específico, ainda que tais comportamentos fossem tolerados durante o carnaval.5
Apesar da mudança no mecanismo de poder que discorria sobre a homossexualidade, esta permaneceu estigmatizada perante os indivíduos "normais", como definido por Goffman (1988), no caso, os heterossexuais. No campo teológico-moral, o sodomita era um pecador; no campo médico-biológico, o homossexual era um doente/anormal incapaz de controlar seus impulsos sexuais.
1.3 Uranistas: uma questão de saúde pública
Como dito anteriormente, o homossexualismo deixou de fazer parte do campo do direito e passou a figurar como interesse médico. O homossexualismo era visto como um perigo para a sociedade, já que era considerado uma doença degenerativa que propiciava a ocorrência de crimes, como o abuso infantil e a vadiagem, dentre outros, uma vez que o homossexual era encarado como "moralmente deficiente".
Deste modo, através de higienistas, médicos-legistas e psiquiatras, o Estado passou a adotar medidas de saúde pública com a intenção de curar os "sexualmente invertidos".6 A partir de então, tornou-se usual no jargão científico o termo uranista, cunhado pelo jurista alemão Karl Heinrich Ulrichs (Fry & MacRae, 1985:62). Nesta conjuntura, surge uma série de propostas de políticas eugenistas e higienistas idealizadas por médicos, como Pires de Almeida, Leonídio Ribeiro e Aldo Sinisgalli, como também uma busca incessante pelas causas e pela cura da homossexualidade, como apontado por Green (2000), Green e Polito (2006) e Fry (1982).
No final do século XIX e início do século XX, o Dr. Pires de Almeida (1906 apud Trevisan, 2011) empenhou-se em buscar as raízes do homossexualismo a partir de confissões detalhadas de homossexuais acerca de suas práticas, das cartas que escreviam etc. Com propostas preventivas e educativas, estimulava a convivência das crianças com o sexo oposto e, para aqueles que já apresentavam sinais de homossexualismo, o aconselhamento para a volta à "normalidade". Caso o aconselhamento não obtivesse sucesso, seriam necessários métodos mais persuasivos, como pode ser percebido na passagem "não se hesitará até diante de certos subterfúgios [...], tal como o de provocar o coito invertido com mulheres vestidas de homem ou mesmo obrigá-lo a pernoitar com mulheres completamente nuas, ainda que não as goze" (Pires de Almeida, 1906 apud Trevisan, 2011:181). Foi também Pires de Almeida quem incentivou a importação de prostitutas estrangeiras para controlar a disseminação da homossexualidade no Rio de Janeiro.
Leonídio Ribeiro, inspirado pelas teorias do criminologista italiano Cesare Lombroso,7 defendeu um modelo de intervenção baseado no transplante de testículos e ovários para corrigir as falhas de produção de hormônios masculinos e femininos, vistas como causa de homossexualidade. Só assim, os "invertidos" poderiam se tornar verdadeiros homens e mulheres. Segundo ele,
provado que o homossexualismo é, em grande número de casos, uma conseqüência de perturbações do funcionamento das glândulas de secreção interna, logo surgiu a possibilidade de seu tratamento. Era mais um problema social a ser resolvido pela medicina (Ribeiro, 1938 apud Green & Polito, 2006:90).
Ainda mais radical que os dois primeiros, no final da década de 1930, o médico-legista Aldo Sinisgalli (1938-9apud Trevisan, 2011) afirmava que os uranistas eram perigosamente anormais e, portanto, não podiam conviver com o restante da "sociedade sadia". Para isso, ele recomendou a criação de um "instituto para pederastas", no qual ficariam confinados para serem estudados e receberem tratamento adequado, mantendo, assim, a "população normal" a salvo. De acordo com ele
Os homossexuais, os pederastas, não são homens normais.
Como anormais precisam de tratamento adequado.
A punição, reclusão em presídios, é injustiça [sic] e não traz o mínimo de resultado prático.
Deixar em Liberdade elementos perniciosos é perigoso e prejudicial à sociedade.
Logo, um instituto para pederastas se faz necessário.
Far-se-ia a seleção profissional, gozando os invertidos de relativa liberdade.
Propugnamos por um dispositivo legal permitindo a internação dos pederastas perniciosos ao meio social nesse instituto (Sinisgalli, 1938-40 apud Green, 2000:217; grifo nosso).
Assim, durante a Primeira Semana Paulista de Medicina Legal, em 1937, diversos juristas e médicos apresentaram trabalhos que propunham a inclusão de dispositivos punitivos para os homossexuais no novo Código Penal de 1940. Neste sentido, foi divulgada no evento a máxima "cadeia para o pervertido e manicômio para o demente" (Figari, 2007:161). No entanto, devido à falta de resultados das propostas citadas acima, a homossexualidade não foi recriminalizada no Código Penal ainda em vigor.
1.4 Os homossexuais saem do armário
Em 28 de junho de 1969, se deu um enfrentamento entre gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros contra a polícia nos arredores do bar Stonewall Innlocalizado no Greenwich Village, em Nova York. Este episódio ficou conhecido como a Revolta de Stonewall e é considerado o marco inicial do movimento homossexual americano, sendo atualmente o Dia Mundial do Orgulho Gay.
No Brasil, os grupos militantes pelas causas homossexuais surgiram em meados dos anos 1970, no período de abertura política dos últimos anos da ditadura militar. Em sua formação, segundo Facchini (2005), o movimento tinha um marcado espírito antiautoritário e carregava ideais da contracultura. Com isso, visavam não apenas à aceitação da homossexualidade, mas também à revolução no modo como a sexualidade era vivenciada. A homossexualidade assumiria, então, um papel transformador da cultura heteronormativa.
Uma das primeiras demandas do movimento homossexual brasileiro foi a retirada do homossexualismo do rol de doenças do Instituto Nacional de Previdência Social, fato ocorrido em 1985 após uma decisão do Conselho Federal de Medicina.8 Em 1999, essa decisão foi consolidada quando o Conselho Federal de Psicologia proibiu o tratamento da homossexualidade por parte dos psicólogos. A homossexualidade deixou de ser uma patologia ou uma perturbação e tornou-se, ao menos oficialmente, uma variedade da sexualidade humana, da mesma forma que a heterossexualidade.
Facchini (2005) aponta que o movimento se baseava na afirmação de uma identidade comum, no caso, a homossexualidade.9 A obra de Foucault (2011) sobre a scientia sexualis mostra como esta se tornou um mecanismo de "produção da verdade do sujeito através do sexo" e, assim sendo, a sexualidade assume um significado maior do que o seu mero exercício erótico, adquirindo uma função identitária que gira em torno não apenas de práticas sexuais, mas da construção de uma subjetividade, articulando as esferas pública e privada. Com isto, a sexualidade relaciona-se a uma representação que o indivíduo faz de si quando em contato com outros membros da sociedade, para deles se aproximar ou se diferenciar. Tais representações singulares, ao serem compartilhadas em maior ou menor escala com outros indivíduos, criam um senso de pertencimento e promovem uma identidade coletiva, que pode ou não estar politicamente organizada e/ou representada (Woodward, 2000). No caso dos militantes, a identidade sexual, como discutida por Heilborn (1996), assume uma posição central na apresentação de si ao restante da sociedade.
1.5 A epidemia de AIDS e seu impacto no Movimento Homossexual
Surgida no início dos anos 1980, a epidemia de HIV/AIDS teve um importante impacto na organização do movimento homossexual brasileiro. A doença, chamada também de "câncer gay", foi responsável por uma forte reação de intolerância por parte da sociedade. Tal fator, aliado ao elevado número de mortes provocadas pela doença, fez com que em um primeiro momento o movimento diminuísse consideravelmente suas atividades.
A tensão pôde ser claramente percebida quando em 1988, durante a aprovação da nova Constituição, o plenário do Congresso da Constituinte votou em peso contra a inclusão do item que previa a proibição da discriminação por orientação sexual, chamada popularmente de "emenda dos viados" e, mais especificamente pela bancada religiosa, de "emenda da desorientação sexual" (Trevisan, 2011).
Tal contexto desencadeou uma onda de violência e repressão, pontos que passaram a ser energicamente combatidos pelos ativistas homossexuais a partir dos anos 1990. Ramos e Carrara (2006) escrevem que nessa conjuntura "o movimento homossexual brasileiro divulgou a expressão ‘homofobia’ para caracterizar este tipo de violência [contra homossexuais]" (2006:186).
1.6 Orgulho Gay: a resposta do Movimento Homossexual
De acordo com Facchini e França (2009), a partir dos anos 1990 e sucessivamente nos anos 2000, os movimentos homossexuais ganharam novo fôlego e tornaram-se expressivos novamente. Nessa época, foram adotados formatos institucionais de organização semelhantes ao modelo das ONGs; também ocorreram parcerias com outras organizações e instituições em diversos âmbitos da sociedade, como o religioso, o político, o da saúde etc. Nesse cenário, a postura do movimento homossexual se modificou: a vitimização dos anos 1980 foi gradualmente substituída pelas ideias de orgulho e visibilidade. Assim, em 1995 foi realizada a Primeira Parada Gay no Brasil, na cidade do Rio de Janeiro, no mesmo ano em que a então deputada federal Marta Suplicy apresentava um projeto de lei que visava regulamentar a união civil entre pessoas do mesmo sexo. Tal projeto permaneceu no limbo do Legislativo até 2001, quando foi retirado de pauta.
Facchini (2005) afirma que houve um crescimento das atividades dos grupos militantes nas décadas de 1990 e 2000, o que contribuiu em parte para a especificação de um grande número de sujeitos políticos dentro do movimento homossexual. Estes grupos passaram a se denominar por diversas siglas, como GLT (Gays, Lésbicas e Travestis); GLBT (Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais); GLS (Gays, Lésbicas e Simpatizantes10) etc. Deste modo, os grupos foram acusados de gerar uma verdadeira "sopa de letrinhas", o que impedia uma organização única e formal, como também dificultava sua assimilação por outros setores da sociedade.
1.7 O Movimento LGBT 30 anos depois
Desde seu surgimento, o movimento homossexual brasileiro conseguiu uma série de conquistas, dentre estas, a desclassificação; e a recente decisão do Supremo Tribunal Federal brasileiro, que votou unanimemente na constitucionalidade de interpretação extensiva do art. 226, §3º da Constituição,11 para incluir em seu escopo as uniões entre pessoas do mesmo sexo. No entanto, o Projeto de Lei 122/2006 da deputada federal Iara Bernardi, do Partido dos Trabalhadores (PT) de São Paulo, permanece tramitando no Senado até os dias atuais. O texto original já foi modificado diversas vezes, sendo uma das últimas alterações feita pela senadora Marta Suplicy: devido à forte pressão da bancada evangélica, ela abriu um permissivo para o discurso religioso discriminatório, desde que pacífico, conforme será abordado abaixo.
O movimento homossexual brasileiro completou 30 anos em 2008, ano em que foi realizada a Primeira Conferência Nacional GLBT,12 na qual foram aprovadas 569 propostas que tinham por objetivo a efetivação da cidadania de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais.13 Cabe salientar que o Brasil é o primeiro país a realizar uma atividade com tamanha dimensão no que se refere aos direitos LGBT (Facchini & França, 2009).
Após avanços – como a já citada decisão do Supremo Tribunal Federal – e retrocessos – como a suspensão arbitrária do material didático do projeto Escola sem Homofobia14 – no campo político, em dezembro de 2011 foi realizada a Segunda Conferência Nacional LGBT. Sob forte clima de tensão, representantes de vários grupos militantes vaiaram a ausência da presidente Dilma Rousseff, como também apresentaram diversas críticas às posturas da mesma em relação ao tema.
Conforme já apontado, um dos mais importantes pleitos do movimento homossexual atualmente é a criminalização da homofobia. Os próximos tópicos abordarão esta questão, desde o que se entende pela expressão homofobia até a necessidade de efetivação de tal projeto.

2. O que é homofobia?
Teoricamente, a homofobia pode ser definida em poucas palavras: trata-se de ações discriminatórias perpetradas contra homossexuais, como explicitado por Borrillo (2010). Contudo, o entendimento do conceito vai muito além: constitui-se em uma violência que pode assumir dois sentidos: o físico, que atinge diretamente a integridade do corpo do indivíduo, podendo chegar ao homicídio nos piores casos; e o não físico, que se configura como uma espécie de violência simbólica, composta por xingamentos, tratamento diferenciado, impedimento de participação em instituições. Desta forma, o termo homofobia, como amplamente divulgado na mídia, dá conta de duas dimensões: uma pessoal, de caráter afetivo, manifestada através da rejeição dos homossexuais; e outra cultural, na qual se repudia a homossexualidade como fenômeno social (Borrillo, 2010:22).
Nos trabalhos dos autores Carrara e Vianna (2004, 2006), Ramos (2010), Carrara e Ramos (2005), Carrara, Ramos e Caetano (2003) e Carrara et al. (2006), é demonstrado como a homofobia é um fenômeno com diversas facetas, presente, de diferentes formas, em esferas individuais e institucionais. Todos eles apontam para a imbricação da discriminação homofóbica com outros marcadores sociais, como gênero, identidade sexual, geração, classe e raça/cor. Especificamente, Ramos e Carrara (2006) verificam que a violência letal atinge de forma mais agravada indivíduos cuja homossexualidade é mais evidente e aqueles que conjugam diversos estigmas, principalmente travestis.
Segundo Rios (2007), a homofobia é um tipo de discriminação injusta, pois fere sistematicamente uma série de direitos básicos de cidadãos homossexuais. Antes de aprofundarmos a discussão, é preciso reproduzir aqui a distinção existente entre preconceito e discriminação, habilmente tratada por Vecchiatti (2011) e Rios (2007), de grande importância em matéria penal. Enquanto o preconceito é o juízo de valor desarrazoado ou irracional, isto é, um dado que ocorre nas raias do pensamento e no íntimo do sujeito, a discriminação é a sua exteriorização por meio de comportamentos que refletem o tratamento diferenciado dado a alguém.
Outra definição de discriminação, baseada em convenções das Nações Unidas acerca do tema, é dada por Piovesan (2009):
A discriminação significa toda distinção, exclusão, restrição ou preferência que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício, em igualdade de condições, dos direitos humanos e liberdades fundamentais, nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo. Logo, a discriminação sempre significa desigualdade (2009:187).
Isto posto, destaca-se que à tutela penal cabe apenas tratar da ação, da conduta, uma vez que não lhe é lícita a punição do pensamento, o que, ademais, seria inconstitucional, nos termos do art. 5º, VIII, da Constituição Federal brasileira. Assim, o que se pretende com uma lei penal acerca da homofobia é a mera punição das condutas discriminatórias.
A homofobia é derivada do preconceito contra LGBTs, que compõem um grupo de indivíduos estigmatizados. Em uma perspectiva sociológica, o preconceito aparece na interação entre diferentes grupos que, a partir de um quadro de relações de poder, produz uma hierarquia entre os mesmos (Rios, 2007). O preconceito de cunho homofóbico tem suas origens no sexismo, marcadamente presente na sociedade brasileira. Os papéis de gênero se confundem aqui com papéis sexuais. Por isso, é tão difícil pensar em um homem com trejeitos "tipicamente femininos" ou em uma mulher "masculinizada" que sejam heterossexuais. Em outras palavras, no Brasil há uma demarcação das características masculinas e femininas que são baseadas na suposta diferenciação entre os sexos.
Assim sendo, os homossexuais são acusados de romper com esse paradigma, uma vez que a homossexualidade é capaz de fazer com que homens assumam uma postura passiva, que é destinada às mulheres; e que mulheres assumam uma postura ativa, reservada aos homens (Fry & MacRae, 1985). De acordo com Borrillo (2010), a divisão binária de gêneros e o desejo heterossexual são dispositivos de reprodução da ordem social, não somente da reprodução biológica da espécie humana. Daí a visão da homofobia como uma "guardiã das fronteiras tanto sexuais (hétero/homo) como de gênero (masculino/feminino)" (Borrillo, 2010:16).
Apesar da gravidade desse tipo de discriminação, escassas e não muito eficazes são as políticas públicas que visam ao enfrentamento da homofobia no Brasil. Isto pode ser encarado como produto da não aceitação da homossexualidade pela sociedade, sendo classificada como imoralidade e/ou – ainda que para poucos – como doença ou desvio psicológico. Com isto em mente, não é de se surpreender que as práticas homofóbicas não sejam classificadas como um problema, quando não são legitimadas, o que leva a uma estagnação no campo político no que se refere ao seu combate.
De acordo com Venturi e Bokany (2011), coordenadores da pesquisa Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil,15 a quase totalidade dos entrevistados respondeu afirmativamente sobre a existência de preconceito contra LGBTs no Brasil.16 Contudo, o número de pessoas que admitiram os próprios preconceitos é nitidamente menor.17 Assim, além do preconceito assumido, a pesquisa buscou também levantar dados sobre preconceito velado através de três estratégias: perguntas sobre aversão a pessoas ou a grupos sociais considerados "diferentes"; concordância ou discordância em relação a frases "que costumam ser ditas sobre os homossexuais – coisas que algumas pessoas acreditam e outras não"; e por fim, perguntas sobre reações a situações reais e/ou hipotéticas sobre contato com LGBTs em ambientes profissionais, de ensino, no grupo de amigos etc. A partir destas perguntas, os autores indicam que 6% da amostra foram classificados como portadores de "preconceito forte" contra LGBTs; 39% tendo "preconceito mediano"; 54% tendo "preconceito leve"; e apenas 1% não expressou qualquer nível de preconceito.
O termo homofobia, inobstante estar sedimentado e ser largamente utilizado tanto pelos leigos quanto por aqueles que estudam o tema (tendo por isso sido também adotado no presente estudo), sofre críticas. Neste sentido, segundo Nunan (2003), o termo corrente pode transmitir a falsa ideia de que o preconceito contra homossexuais pode ser mais bem compreendido como uma forma de psicopatologia, um tipo de fobia individualizada, como um medo ou aversão irracional. Em sentido oposto, o termo heterossexismo, mais aparentado com o machismo e o racismo, descreveria um sistema ideológico, sociocultural e institucional no qual a homossexualidade é apresentada como inferior à heterossexualidade, dando prevalência ao aspecto coletivo do preconceito em detrimento das ações individuais.

3. Aspectos jurídicos da criminalização da homofobia
3.1 Criminalização como legitimação
A criminalização de determinadas condutas importa uma escolha política de valoração hierarquizada de bens jurídicos, tendo em vista que a ordem normativa dispõe de uma ampla gama de mecanismos de contenção e punição de comportamentos entendidos pelo Direito como socialmente perniciosos, sendo o Direito Penal apenas um dentre estes. O Direito Penal se configura, de acordo com a dogmática jurídica, como o meio de tutela mais gravoso e, por isso mesmo, residual, devendo ser implementado apenas quando os outros falham ou quando o bem a ser protegido possui especial valor axiológico.18 Dito de outra forma, a tutela penal de determinado bem jurídico implica o reconhecimento de sua especial importância e de sua fundamentalidade. Neste sentido, de acordo com Bottini (2010), "o direito penal [...] ao apontar os comportamentos menos tolerados, acaba por revelar os valores sociais mais prezados".
Assim, a criminalização da homofobia seria uma declaração da ordem jurídica de que a discriminação em função da orientação sexual não pode ser tolerada e que a liberdade sexual constitui bem jurídico essencial. A mudança, como se vê, não é meramente técnico-legislativa, mas representa a legitimação de uma série de demandas dos movimentos homossexuais, como já abordado em tópico anterior. A positivação dos direitos gays numa lei criminalizadora da discriminação de cunho homofóbico oficializaria o compromisso do Estado e da ordem jurídica brasileira na defesa da liberdade sexual.
A recente decisão do Supremo Tribunal Federal brasileiro em matéria de união estável representa o fim de uma jurisprudência vacilante e a ratificação da conformidade da família homoafetiva com o sistema constitucional brasileiro. Todavia, a questão homossexual ainda é tutelada quase exclusivamente pelo Poder Judiciário, sendo tratada com acanhamento pelo Legislativo,19 único legitimado para a criação de novos tipos penais. Tal omissão, longe de ser neutra, é um reflexo do preconceito que permeia nossa sociedade e se faz sentir com vigor no Legislativo. Nas palavras de Maria Berenice Dias: "A ausência de lei, que leva à exclusão do sistema jurídico, é a forma mais perversa de condenação à invisibilidade" (2011:164).
3.2 Discriminação em função de orientação sexual e a Lei do Racismo
A Constituição de 1988 inaugurou um novo paradigma na ordem jurídica nacional, no qual os direitos fundamentais, anteriormente eclipsados pelo governo ditatorial, irradiam sua influência como pontos de partida e de chegada necessários à concretização do Direito. Dentre estas garantias fundamentais, insere-se a celebrada no caput do art. 5º20 da Carta Magna: o princípio da igualdade, segundo o qual todos os seres humanos são iguais em dignidade perante a lei. Importante ressaltar, ainda, que a igualdade se faz presente na Lei Maior em sua dúplice configuração: formal e material.
Como corolário de tal axioma, importa dizer que não apenas é proibido o tratamento desigual e arbitrário, mas que o Estado também deve ter uma atuação positiva no sentido de coibir a discriminação, requerendo a superação de situações de fato nas quais indivíduos são tratados como "cidadãos de segunda classe". Pode-se antever, assim, um verdadeiro mandamento constitucional para a ação estatal – e outra não poderia ser a conclusão, tendo em vista o teor de seu art. 3º, IV21 – se necessário até mesmo através da lei penal. Apenas por meio desta atuação é que a sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, descrita em seu preâmbulo, pode se efetivar.
Neste diapasão, muito em função do art. 5º, XLI e XLII,22 o qual determina expressamente a criminalização do racismo, o legislador brasileiro tem entendido que o Direito Penal é o mecanismo natural de contenção das práticas discriminatórias. A Lei 7.716/89,23 a chamada Lei do Racismo, que inicialmente apenas concretizava tal mandamento constitucional, acabou por se tornar a base jurídica da criminalização de qualquer forma de discriminação fundada em preconceito, como da que ocorre em função de procedência nacional e por religião. A criminalização da homofobia apenas seguiria esta tendência. Tal entendimento levou o ministro do Supremo Tribunal Federal brasileiro, Marco Aurélio de Mello (2007), a eloquentemente questionar "Se a discriminação racial e a de gênero já são crimes, por que não a homofobia?".
Partindo desta premissa, a inclusão da homofobia na Lei do Racismo, contrariamente a ser incoerente, visa à sistematização do Direito Penal Antidiscriminatório em diploma legislativo único, de forma que a lei estaria punindo não apenas a homofobia, mas também o sexismo, a discriminação religiosa, a xenofobia etc. com as mesmas penas previstas para os casos de racismo. Esta equiparação entre as penas busca a efetivação do princípio da proporcionalidade, segundo o qual o quantum punitivo de determinado delito deve guardar relação com sua danosidade, de forma que delitos de semelhante danosidade social devem possuir penas semelhantes (Feldens, 2007). Com isto, procura-se demonstrar que o Estado brasileiro, além de não tolerar nenhum tipo de discriminação, não faz distinção entre estas.
Assim, ainda que certos setores da doutrina24 critiquem as penas previstas pela Lei do Racismo como excessivas e desproporcionais, a homofobia não deve ser criminalizada com penas reduzidas em relação a outras formas de discriminação. Caso contrário, tal situação importaria na declaração de que a discriminação em função da orientação sexual é menos grave – isto é, mais aceitável – do que outras formas de discriminação, sendo o bem jurídico tutelado in casu menos importante, consoante a relação de proporcionalidade que deve haver entre a danosidade social, isto é, entre e o grau de condenação de uma determinada conduta criminosa e a pena a ela colimada (Pulido, 2007).
3.3 Da necessidade de se criminalizar a homofobia
Inexiste no Brasil uma lei nacional acerca do tratamento que deve ser dado à discriminação em função da orientação sexual, de forma que, ante a necessidade de se combatê-la e a cobrança de diversos setores sociais, multiplicam-se os diplomas legislativos estaduais e municipais acerca do tema, conforme apontado por Vianna e Lacerda (2004). Uma lei mais homogênea e abrangente, entretanto, se impõe, principalmente porque estados e municípios em nosso atual sistema federativo possuem reduzida competência, de sorte que suas iniciativas, embora de importância inegável, têm aplicação geográfica limitada e terminam por lidar apenas pontualmente com o problema.
O tratamento legislativo em âmbito nacional é, ademais, premente. Mesmo na ausência de dados oficiais, os estudiosos do tema de vários campos do conhecimento (Carrara & Lacerda, 2011; Mott, 2000; Rios, 2007) verificam que suas pesquisas convergem para a mesma conclusão: a de que a violência motivada pela homofobia é um grave problema no Brasil. De acordo com o ministro do Supremo Tribunal Federal brasileiro, Marco Aurélio de Mello (2007), o Brasil é campeão mundial em se tratando de homofobia, com mais de 100 homicídios cometidos anualmente. Segundo dados coletados pelo Grupo Gay da Bahia, em 2011 foram cometidos 251 homicídios motivados por homofobia (GGB, 2012). Estes números refletem apenas uma das faces – ainda que a mais extrema – da homofobia, pois os crimes de ódio não se resumem ao homicídio e o preconceito se manifesta muitas vezes de forma mais sutil do que a violência física, tiranizando o individuo moral e psicologicamente na sua comunidade, no seu trabalho e até mesmo no seio de sua família.
Assim, invocar a tutela penal parece adequado. Contudo, é importante destacar que a mesma não promoverá a conscientização social ou o valor da tolerância, uma vez não lhe é própria uma função pedagógica, mas apenas a de impedir a perpetração de condutas discriminatórias. Cabe aqui resgatar a distinção entre preconceito e discriminação para esclarecer que não pretende a lei penal, por não lhe ser objeto, a correção ou anulação do preconceito. Ela se presta somente, conforme já dito, à tutela da discriminação (Vecchiatti, 2011).
Neste sentido, Piovesan (2009) destaca que a implementação da igualdade passa por duas vertentes: o combate à discriminação, por meio de um comportamento estatal repressivo à exclusão, e a promoção da igualdade, efetivada por medidas positivas e promocionais de inclusão e compensação. Assim, as duas facetas devem estar sempre associadas, sendo insuficiente que o Estado contemple exclusivamente uma destas. Por óbvio, a proibição da exclusão, isto é, a criminalização da homofobia, não gera ipso facto a inclusão, que deverá ser buscada de outras maneiras. Por conseguinte, tem-se que o tema ora analisado, embora importante, está afeito a apenas uma destas dimensões, sendo necessária a adoção de medidas complementares para uma efetiva garantia da igualdade e cidadania das minorias sexuais.
3.4 O PLC122/2006 e outros projetos de lei
O PLC122/2006 (Projeto de Lei da Câmara n. 122 de 2006), que atualmente se encontra tramitando no Senado Federal, após ter sido aprovado na Câmara dos Deputados, é o projeto de lei que visa à criminalização de práticas discriminatórias motivadas pela orientação sexual com maior visibilidade e importância. Tal projeto pretende a inclusão da discriminação por orientação sexual e identidade de gênero na Lei do Racismo, de forma a proteger também travestis e transexuais, as mais vitimadas pela violência homofóbica. Após emenda, o projeto passou a prever também a criminalização da discriminação em função da condição de pessoa idosa ou deficiente, fazendo avançar a Lei 7.716/89 enquanto estatuto jurídico geral da criminalização das práticas discriminatórias e proteção penal dos grupos estigmatizados (Vecchiatti, s.d.).
Uma das maiores inovações jurídicas do projeto é a proposta de acrescentar um parágrafo único ao art. 8º da lei para criminalizar o impedimento ou a restrição de manifestações de afeto entre indivíduos do mesmo sexo, com a ressalva de que tais expressões devem ser também permitidas aos demais, destacando a importância da sexualidade e da afetividade enquanto componentes da própria dignidade humana.
Com vistas a permitir um arranjo político mais favorável à aprovação da proposta, a atual relatora do projeto, a senadora Marta Suplicy, propôs incluir no art. 20 da lei, que prevê o fato típico de induzir ou incitar à discriminação, um permissivo para o caso de manifestação pacífica de pensamento decorrente de atos de fé, o que na prática retiraria o discurso religioso discriminatório da órbita de aplicação da lei. Deve-se, entretanto, destacar que esta proposta faz certo sentido tendo em vista a atual composição do Congresso Nacional, com forças políticas que fazem proselitismo religioso e parecem não se importar com a separação de Estado e religião. Tal situação criou um entrave à aprovação do PLC122/2006, bem retratado por Túlio Vianna ao afirmar:
[ao passo que] O Congresso Nacional brasileiro não costuma convidar traficantes de drogas para audiências públicas destinadas a debater se o tráfico de drogas deve ou não ser crime [...] os homofóbicos têm cadeiras cativas em todo e qualquer debate no Congresso que vise a criar uma lei para punir suas discriminações (2011:20).
O PLC122/2006, entretanto, não é o único projeto de lei acerca do tema, existindo outros, como, por exemplo, o PL6418/2005, do senador Paulo Paim. Ao contrário do PLC122/2006, este pretende criar legislação específica para tratar penalmente da homofobia, ao invés de incluí-la na Lei do Racismo. Contudo, tal separação, além de comprometer a eficácia do direito antidiscrimatório brasileiro e a homogeneidade do sistema penal, apresenta uma tutela jurídica mais branda do que a propiciada pela Lei 7.716/89 (Vecchiatti, s.d.). A proteção desigual para as minorias sexuais reflete uma desvalorização da proteção jurídica quando o assunto é homofobia, criando uma hierarquia inconstitucional entre grupos estigmatizados. A proteção jurídica pretendida é insuficiente, uma vez que não contempla situações nas quais o enfrentamento da discriminação motivada pela orientação sexual faz-se necessário, reservando-se quase exclusivamente a tutelar a homofobia no âmbito profissional.
3.5 Críticas à criminalização
A criminalização das condutas discriminatórias motivadas pela homofobia, seja por meio da inclusão destas na Lei do Racismo, seja por meio de diploma legislativo específico, sofre várias críticas de diversos grupos. Dentre estas, uma das mais persistentes é a de que importaria criação de "direitos especiais" ou "privilégios", isto é, num estatuto jurídico mais benéfico aos homossexuais do que o que tutela o resto da sociedade. Esta crítica, entretanto, ignora o expresso mandamento constitucional para a busca da igualdade substancial, o qual exorta o ordenamento jurídico a proteger as minorias em situações de desigualdade fática, por meio da chamada discriminação positiva e, sendo necessário, da tutela penal (Rios, 2006). A sociedade é composta por grupos oprimidos e privilegiados, e o legislador e o juiz não podem ser cegos a estas circunstâncias no processo de criação do direito.
Assim, convém ressaltar que outros grupos sociais estigmatizados em função de sua raça, de gênero, credo, idade, deficiências etc. recebem tutela jurídica notadamente mais benéfica e preferencial, a qual visa garantir a compensação de sua desigualdade fática. Apenas à guisa de exemplo, poder-se-ia citar as disposições do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/03) e o art. 37, VIII da Constituição, que garante a reserva de vagas para pessoas com deficiência física nos empregos e cargos públicos.
Esse processo de especificação dos sujeitos de direito, entendido em suas idiossincrasias e particularidades, em oposição ao tradicional sujeito abstrato, resultou na consolidação de um arcabouço normativo nacional e internacional de proteção especial de indivíduos pertencentes a grupos minoritários ou socialmente estigmatizados. De acordo com Piovesan, "ao lado do sistema geral de proteção, organiza-se o sistema especial de proteção, que adota como sujeito de direito o indivíduo historicamente situado, isto é, o sujeito de direito ‘concreto’" (2009:186).
Destarte, a crítica de que a criminalização importaria em "privilégios" desarrazoados concedidos às minorias sexuais não é procedente, na medida em que um tratamento jurídico especial é justificado em face da realidade fática e esta tutela especial que se pretende não seria novidade ou exclusividade no direito brasileiro, uma vez que já gozada por outros grupos que sofrem preconceito social.
Outros adversários de um diploma legislativo criminalizador da discriminação por orientação sexual argumentam que assassinato, agressão, ofensas etc. já são crimes independentes, de maneira a ser despicienda tal lei. Ora, primeiramente cumpre esclarecer que não é objeto da Lei 7.716/89, na qual se pretende incluir a homofobia, o homicídio, que ademais já possui majorante específica para este tipo de caso.25Neste sentido, relembre-se que a homofobia nem sempre aparece de maneira tão explícita e contundente, podendo estar presente em manifestações menos agressivas, mas tão discriminatórias quanto.
No que tange aos crimes contra a honra e o de lesão corporal, cumpre apontar que as suas penas relativamente baixas os tornam competência dos Juizados Especiais Criminais. Nesta esteira, criminalizar a homofobia teria efeito semelhante à edição da Lei Maria da Penha, que retirou a violência doméstica das raias de uma praxe forense que tornou "barato" bater em mulher, cujos efeitos traumáticos fizeram-se presentes na menção à pena "de cesta básica" no art. 17 do referido diploma legislativo, cujo pagamento era comumente usado como punição no âmbito dos Juizados Especiais Criminais.26 Atualmente, a agressão homofóbica acaba sendo resolvida sem provocar maiores problemas para o agressor, inobstante os traumas que a vítima possa ter sofrido. O agravamento penal desta conduta, com sua consequente retirada da competência dos Juizados Especiais Criminais, traria efeitos importantes sobre o potencial coercitivo da proibição da discriminação por orientação sexual e sobre a percepção da impunidade quando o assunto é homofobia (Vecchiatti, 2011).
Um dos setores que mais apresentam críticas ao projeto de lei é o religioso-cristão, uma vez que o seu discurso costuma ser marcado pela condenação à prática da homossexualidade. Assim, teme-se que a aprovação de um projeto deste tipo importe em lesão ao direito de liberdade de expressão ou de liberdade de culto. Ocorre que tais direitos, como todos, não podem ser encarados de forma absoluta, devendo ser relativizados em face de outras garantias e valores albergados pela ordem jurídica. De acordo com Rios (2011), a proibição do discurso de ódio não se incompatibiliza com a liberdade de opinião ou crença; pelo contrário, apenas as efetiva, na medida em que a prática das liberdades num mundo plural pressupõe seu exercício pacífico e tolerante.
Este recorte do direito de liberdade de expressão, outrossim, visa também evitar a prática de crimes com consequências ainda mais nefastas. Esta perigosa relação já foi denunciada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal brasileiro, Carlos Ayres Britto: "O homofóbico exacerba tanto o seu preconceito que o faz chafurdar no lamaçal do ódio. E o fato é que os crimes de ódio estão a meio palmo dos crimes de sangue" (2011).
Não existe um direito à liberdade de discriminação, seja no discurso laico, seja no proferido do púlpito. O discurso de ódio é, por certo, avesso à Constituição Cidadã, fazendo-se mister combatê-lo. Os que hoje tacham o PLC122/2006 de "mordaça gay" e a criminalização da homofobia de instituição de uma "ditadura gayzista" remetem a discursos já não socialmente aceitáveis que pretendiam legítimo e lícito, por exemplo, diminuir pessoas em função de sua cor, defendendo o direito de ser racista, como se tal teratologia existisse. O uso do direito penal, ademais, como mecanismo constitucional e legítimo para combater a discriminação, já foi atestado pelo Supremo Tribunal Federal e a homofobia tão somente se inclui neste cenário mais amplo de proteção das minorias e dos grupos oprimidos.
No plano de sua execução, cabe destacar que uma eventual criminalização das práticas discriminatórias motivadas por homofobia deve vir acompanhada de uma mudança de paradigma dos seus aplicadores. Ramos e Carrara (2006) afirmam que o discurso dos operadores do direito, não raro, reforça a ideia de que as vítimas teriam contribuído para a prática da violência sofrida com sua "vida de risco" ou comportamento sexual "patológico" e/ou "amoral", o que sepulta desde cedo a possibilidade do uso do direito para a promoção da cidadania das minorias sexuais estigmatizadas, determinando o curso do processo desde os estágios iniciais.
Por fim, autores como Cataldo Neto e Degani (2010) criticam a criminalização a partir do entendimento de que a tutela penal e o encarceramento seriam medidas pouco ou nada efetivas para o combate à homofobia e às discriminações em geral, entendendo que esta deva ser combatida de outras formas. Assim, é destacado que a criminalização do racismo, por exemplo, resultou em pouco ou nenhum ganho efetivo para a cidadania da comunidade afrodescendente e que o preconceito em função da cor da pele ainda é um grave problema. Autores como Ramos (2010) apontam, ainda, que uma saída pela perspectiva punitiva seria uma resposta "pouco criativa" do movimento LGBT que, ao optar pela saída já utilizada, por exemplo, pelos movimentos feminista e negro, estaria em contradição com a sua postura original e inovadora de construir suas demandas. A essas críticas, faz-se necessário revisitar a distinção elaborada por Piovesan (2009) entre medidas de combate à exclusão e medidas de promoção da inclusão, de sorte que a criminalização nunca deva ser entendida como forma única e final de garantia da igualdade e direitos, necessitando sempre ser congregada com outros mecanismos.

Considerações finais
Diante do que foi exposto no artigo, pode-se verificar que a homossexualidade trilhou um longo caminho até chegar ao seu atual nível de aceitação social e organização política. Assim, se por um lado a visibilidade adquirida após a constituição do movimento homossexual como sujeito político foi fundamental na conquista de direitos, por outro, ela foi responsável pelo aumento das manifestações homofóbicas e pelo recrudescimento do discurso discriminatório. Tal consequência perversa da visibilidade se faz sentir, por exemplo, na resistência do Poder Legislativo em assumir sua responsabilidade constitucional na construção de uma sociedade tolerante.
Deste modo, verificamos que a homofobia é um problema grave e necessita de medidas institucionais para seu enfrentamento. O comprometimento do Estado com os direitos LGBT tem sido uma das principais bandeiras do movimento militante, o qual respalda suas reivindicações na Constituição Cidadã de 1988. Embora uma série de mecanismos tenha sido criada em diversas esferas do poder público para o combate à discriminação homofóbica, estes têm se apresentado de forma insuficiente, o que pode ser visto no crescente número de casos de homofobia veiculados pela mídia. Com isso, torna-se indispensável o rechaço da homofobia por meio de sua criminalização, o que permitiria um tratamento em nível nacional.
A tutela penal então não seria apenas mais um desses mecanismos de combate à homofobia; ela configurar-se-ia como o mais eficiente neste sentido. Em outras palavras, seria a celebração do comprometimento do Estado brasileiro com direitos LGBT e com a efetivação da cidadania homossexual.

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1 É preciso esclarecer que os termos "conquista", "avanço", "retrocesso", entre outros, aparecem aqui tendo como referência a perspectiva do movimento LGBT e de suas demandas.
2 Destaca-se que esta seção, por conta de farto material bibliográfico, refere-se principalmente ao tratamento dispensado à homossexualidade masculina. No entanto, alguns aspectos podem ser ampliados para outras formas de vivência da homossexualidade.
3 A primeira visitação à colônia ocorreu entre os anos de 1591 e 1595, tendo percorrido as regiões da Bahia e de Pernambuco. Salvador foi destino ainda de outras duas visitações, nos anos de 1618 e 1646. Constam também visitações ao Rio de Janeiro em 1605 e 1627, e a Minas Gerais, Paraíba, Maranhão e Pará, esta última já entre os anos 1763 e 1769. Todavia, até o encerramento oficial de suas atividades em 1821, a influência do Santo Ofício era sentida na colônia (Trevisan, 2011; Mott, 2000, 2010).
4 (DO ULTRAGE PUBLICO AO PUDOR) Art. 282. Offender os bons costumes com exhibições impudicas, actos ou gestos obscenos, attentatorios do pudor, praticados em logar publico ou frequentado pelo publico, e que, sem offensa á honestidade individual de pessoa, ultrajam e escandalisam a sociedade: Pena – de prisão cellular por um a seis mezes.
5 (DO USO DE NOME SUPPOSTO, TITULOS INDEVIDOS E OUTROS DISFARCES) Art. 379. Usar de nome supposto, trocado ou mudado, de titulo, distinctivo, uniforme ou condecoração que não tenha; Usurpar titulo de nobreza, ou brazão de armas que não tenha; Disfarçar o sexo, tomando trajos improprios do seu, e trazel-os publicamente para enganar: Pena – de prisão cellular por quinze a sessenta dias (grifo nosso).
6 As mulheres homossexuais eram chamadas de tríbadeslesbinitassáficasviragos e fanchonas. Uma das causas da homossexualidade feminina seria a "educação moderna", que retirou a mulher do ambiente doméstico e abriu possibilidades até então desconhecidas por elas (Trevisan, 2011:180).
7 As teorias de Cesare Lombroso buscavam o levantamento das características – biológicas e comportamentais – usuais dos "criminosos natos" (Green & Polito, 2006).
8 Vale a pena destacar que a mesma decisão só ocorreu em nível mundial em 1993, quando o homossexualismofoi retirado do Catálogo Internacional de Doenças da Organização Mundial de Saúde – OMS (Pretes & Vianna, 2008).
9 Sobre este ponto, destaca-se a crítica de Hall (2002) sobre movimentos identitários, que muitas vezes abarcam sob uma mesma designação atores políticos diversos que não possuem necessariamente as mesmas demandas. O movimento LGBT se inscreve nesse raciocínio, pois é constituído por categorias heterogêneas que se reúnem em função do tratamento discriminatório que recebem por parte da sociedade.
10 A sigla GLS surge associada à expansão do mercado voltado para homossexuais. Contudo, este tópico não será aprofundado neste trabalho.
11 Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
[...]
§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
12 Tratou-se de uma conferência realizada pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, órgão com status ministerial, com os objetivos de propor diretrizes para implementação de políticas públicas que visavam promover a cidadania e os direitos humanos de LGBTs, bem como fortalecer o programa federal Brasil Sem Homofobia.
13 Dentre as propostas, estava a que alterava a ordem dos termos, fazendo com que a sigla se tornasse LGBT.
14 Material didático-pedagógico desenvolvido pelo Ministério da Educação e direcionado aos professores interessados em abordar temas relacionados à homossexualidade com alunos do ensino médio. Apelidado de "kit gay" por seus opositores, dentre os quais se incluíam políticos ligados à direita ultraconservadora e a setores religiosos, o polêmico projeto acabou sendo suspenso pela presidente Dilma Rousseff sob o argumento de que o governo não faria "propaganda de opções sexuais" (sic), como anunciado pela Folha de São Paulo(2011a, 2011b e 2011c).
15 Esta foi uma pesquisa nacional, cujo objetivo foi investigar situações de preconceito e discriminação sofridas por indivíduos LGBTs. O estudo foi realizado entre 2008 e 2009 e se dividiu em dois distintos universos: um composto pela população brasileira urbana adulta (16 anos ou mais), com um total de 2.014 entrevistas; e outro composto por pessoas que se declararam homossexuais, somando 413 entrevistas.
16 93% responderam que existe preconceito contra travestis; 91% contra transexuais; 92% contra gays e lésbicas; e 90% contra bissexuais.
17 29% admitiram ter preconceito contra travestis; 28% contra transexuais; 27% contra lésbicas e bissexuais; e 26% contra gays.
18 O que a doutrina juspenalista chama de princípio da fragmentariedade ou da ultima ratio (Bitencourt, 2009).
19 Neste sentido, merece relevo como exceção a esta regra o art. 2º da Lei nº 11.340/06 (Lei Maria da Penha),in verbis: "Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social" (grifo nosso).
20  Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...]
21 Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
[...]
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
22 XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;
23 Embora este tenha sido o primeiro diploma legislativo a tratar o racismo como crime, o preconceito racial já era contravenção desde 1951, em função da chamada Lei Afonso Arinos (Lei 1.390/51).
24 Neste sentido, Luiz Régis Prado (2012) e Damásio de Jesus (2012) argumentam que a severidade das penas colimadas às condutas típicas previstas na Lei nº 7.716/89 fizeram com que muitas situações de racismo fossem enquadradas no crime de injúria (art. 140 do Código Penal), que possui punição notadamente mais branda. Tal situação motivou o legislador a editar a lei nº 9.459/97 que, além de modificar a lei nº 7.716/89, incluiu o § 3º no art. 140 do Código Penal para prever uma espécie de injúria qualificada por motivação discriminatória ou preconceituosa. Estes mesmos autores, entretanto, argumentam que a pena colimada (um a três anos de reclusão e multa) seria flagrantemente desproporcional se comparada a outros crimes muito mais graves, como o homicídio culposo (art. 121, § 3º do Código Penal), cuja pena abstratamente prevista é de um a três anos de detenção.
25 O Art. 121, § 2°, II, do Código Penal prevê o motivo fútil como agravante para o crime de homicídio.
26 Os Juizados Especiais Criminais são órgãos da Justiça criados pela Lei nº 9.099/95 com competência para a conciliação, o julgamento e a execução das infrações penais de menor potencial ofensivo, isto é, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 02 (dois) anos. Caracterizam-se por um rito processual mais célere e simplificado em relação aos juízos tradicionais.

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