terça-feira, 25 de novembro de 2014

O contrato de cessão de direitos de meação e herança.

A cessibilidade ou renúncia da meação. A exigência da escritura pública e a possibilidade de renúncia por termo nos autos

Cessão e renúncia de direitos hereditários e direitos de meação. Formalização por escritura pública ou termos judiciais? O que diz a lei, os doutrinadores e os tribunais? Como deve agir o registrador de imóveis? .
Partilha de pagamento a um cessionário de direitos hereditários extraído de autos de arrolamento, cuja cessão foi procedida por termo judicial. Para os doutrinadores se trata da tal renúncia translativa. Entendendo que cabe ao registrador examinar a formalidade dos atos que deu origem ao Formal – uma vez que resultante de arrolamento em cujo processo o juiz homologa partilha celebrada entre os interessados sem, muitas vezes, examinar a formalização de atos – e considerando o disposto no artigo 1793 do CCB: “O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública”, resolvi verificar o que está sendo decidido nos tribunais. Encontrei o seguinte:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 731.012-7, DA COMARCA DE CASTRO - VARA CÍVEL E ANEXOS.
AGRAVANTE: WERNER HENRICH SCHÜLLER.
RELATOR : DES. RAFAEL AUGUSTO CASSETARI.
AGRAVO DE INSTRUMENTO – INVENTÁRIO – CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS – TERMOS NOS AUTOS – RENÚNCIA TRASLATIVA – POSSIBILIDADE DESDE QUE SUBSCRITO PELO CEDENTE OU PROCURADOR COM PODERES EXPRESSOS E ESPECÍFICOS CONFERIDOS MEDIANTE INSTRUMENTO PÚBLICO DE MANDATO – AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO.
I) Nada justifica que a cessão de direitos hereditários apenas possa ser feita mediante escritura pública quando se admite que a renúncia aos mesmos direitos seja efetivada por termo judicial.
II) Pode a cessão de herança, todavia, ser concretizada mediante termo nos autos, hipótese na qual, em respeito à segurança do juízo, a subscrição deverá ser feita pelos cedentes pessoalmente ou por meio de procurador com poderes especiais conferidos mediante instrumento público. (TJSC - AI nº 2005.015654-6, da Capital, rel. Des. Marcus Túlio Sartorato, j. em 19-8-2005).”
Diante desta decisão, resolvi consultar jurisprudências de outros tribunais. Encontrei, entre outras, estas::
TJ-DF - Agravo de Instrumento AGI 20130020293096 DF 0030258-70.2013.8.07.0000 (TJ-DF) Data de publicação: 05/05/2014 – Publicado n o DJE em 05/05/2014, pag200,
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO. CESSÃO DE DIREITOHEREDITÁRIO. SUPRIMENTO POR DECISÃO JUDICIAL. ESCRITURA PÚBLICA.MEAÇÃO. 1. SUPRE A FALTA DE ESCRITURA PÚBLICA DE CESSÃO DE DIREITOHEREDITÁRIO, NA FORMA DO ART. 1.793 , DO CC , A SENTENÇA QUE CONVALIDA O NEGÓCIO JURÍDICO DE CESSÃO DE DIREITO HEREDITÁRIO, POR FALTA DE ESCRITURA PÚBLICA, DECLARANDO VÁLIDO O NEGÓCIO JURÍDICO.
TJ-PR - Agravo de Instrumento AI 7310127 PR 0731012-7 (TJ-PR)
Data de publicação: 23/02/2011
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO – INVENTÁRIO
CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS -TERMOS NOS AUTOS - RENÚNCIA TRASLATIVA - POSSIBILIDADE DESDE QUE SUBSCRITO PELO CEDENTE OU PROCURADOR COM PODERES EXPRESSOS E ESPECÍFICOS CONFERIDOS MEDIANTE INSTRUMENTO PÚBLICO DE MANDATO - AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. I) Nada justifica que a cessão de direitos hereditários apenas possa ser feita mediante escritura pública quando se admite que a renúncia aos mesmos direitos seja efetivada por termo judicial. II) Pode a cessão de herança, todavia, ser concretizada mediante termo nos autos, hipótese na qual, em respeito à segurança do juízo, a subscrição deverá ser feita pelos cedentes pessoalmente ou por meio de procurador com poderes especiais conferidos mediante instrumento público. (TJSC - AI nº , da Capital, rel. Des. Marcus Túlio Sartorato, j. em 19-8-2005).
TJ-RS - Agravo de Instrumento AI 70022480255 RS (TJ-RS)
Data de publicação: 12/12/2007
Ementa: SUCESSÕES. INVENTÁRIO. CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS. TERMO NOS AUTOS -.DISPENSA DE ESCRITURA PÚBLICA. POSSIBILIDADE,- SEGUNDO DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA MODERNAS, DE A CESSÃO SE PROCESSAR NOS PRÓPRIOS AUTOS DO INVENTÁRIO, COMO OCORRE COM A RENÚNCIA ( CC , ART. 1.806 ). DESAPEGO À FORMA, PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DO PROCESSO. SEM PREJUÍZO, ENTRETANTO, DA TRIBUTAÇÃO DEVIDA, PASSANDO PELA HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 1.793 DO CCB. AGRAVO PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70022480255, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Ari Azambuja Ramos, Julgado em 07/12/2007)
TJ-RS - Agravo de Instrumento AI 70016386385 RS (TJ-RS)
Data de publicação: 17/08/2006
Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO
ARROLAMENTO. CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS. TERMO NOS AUTOS.  POSSIBILIDADE. É certo que a lei determina que a cessão de direitos hereditários deve ser feita através de escritura pública (CCB, art. 1.793).No entanto, em atenção à economia, à celeridade e à instrumentalidade processuais, convém, atento às peculiaridades de cada caso concreto, mitigar o rigor formal e permitir seja a cessão feita por termo nos autos.AGRAVO PROVIDO. EM MONOCRÁTICA. (Agravo de Instrumento Nº 70016386385, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 08/08/2006)
TJ-RS - Agravo de Instrumento AI 70044560316 RS (TJ-RS)
Data de publicação: 06/09/2011
Ementa: INVENTÁRIO. CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS. 1. Com ressalva do entendimento pessoal, a jurisprudência dominante neste Tribunal de Justiça admite a cessão de direitos hereditários por termo nos autos do inventário, com suporte no art. 1.806 do Código Civil , pois essa disposição legal abrange tanto da renúncia abdicativa, quanto da renúncia translativa, denominação doutrinária que se refere, em verdade, à cessão de direitos hereditários. 2. Embora o art. 1.793 do Código Civil estabeleça que a cessão de direitos deve se formalizada através de escritura pública, entende-se que a. renúncia translativa pode ser formalizada por termo nos autos, pois é também forma pública de externar a vontade. Recurso provido.
TJ-SC - Agravo de Instrumento AI 156546 SC 2005.015654-6 (TJ-SC)
Data de publicação: 19/08/2005
Ementa: CIVIL - DIREITO SUCESSÓRIO - INVENTÁRIO - PRINCÍPIO DA SAISINE - VENDA DO ÚNICO BEM IMÓVEL PELOS HERDEIROS EFETIVADA DURANTE A ÉGIDE DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM - CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS MEDIANTE TERMO NOS AUTOS - POSSIBILIDADE DESDE QUE SUBSCRITO PELOS CEDENTES OU POR PROCURADOR COM PODERES EXPRESSOS E ESPECÍFICOS CONFERIDOS MEDIANTE INSTRUMENTO PÚBLICO - SEGURANÇA DO JUÍZO - EQUIPARAÇÃO À RENÚNCIA TRANSLATIVA - INTERPRETAÇÃO SISTÊMICA DOS ARTS. 1.581 E 1.773 DO ANTIGO DIPLOMA - REQUERIMENTO DE DILAÇÃO DO PRAZO PARA A REGULARIZAÇÃO DA CESSÃO - DEFERIMENTO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO Sob a égide do Código Civil de 1916 , a escritura pública para cessão de direitos hereditários, assim como atualmente exige a Lei 10.406 /02, era condição sine qua non para a validade do ato, ex vi dos seus arts. 44 , III , e 134 , II . Pode a cessão de herança, todavia, ser concretizada mediante termo nos autos, hipótese na qual, em respeito à segurança do juízo, a subscrição deverá ser feita pelos cedentes pessoalmente ou por meio de procurador com poderes especiais conferidos mediante instrumento público.
TJ-SC - Agravo de Instrumento AI 78126 SC 2003.007812-6 (TJ-SC)
Data de publicação: 27/08/2004
Ementa: DIREITO SUCESSÓRIO - PROCESSUAL CIVIL - ARROLAMENTO SUMÁRIO - CESSÃO DEDIREITOS HEREDITÁRIOS MEDIANTE TERMO NOS AUTOS - POSSIBILIDADE - INTERPRETAÇÃO SISTÊMICA DO ART. 1.806 DO CÓDIGO CIVIL - EQUIPARAÇÃO DA RENÚNCIA TRANSLATIVA À CESSÃO HEREDITÁRIA - RIGORISMO DO ART. 1.793 , CAPUT, DO CÓDIGO CIVIL DISPENSADO DESDE QUE O TERMO SEJA SUBSCRITO PELOS CEDENTES E/OU POR PROCURADOR COM PODERES EXPRESSOS MEDIANTE INSTRUMENTO PÚBLICO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO É possível a cessão de direitos hereditários mediante termo nos autos. Todavia, a subscrição deverá ser feita pelo próprio cedente ou por procurador com poderes especiais constituídos mediante instrumento público.

No STJ, no entanto, se encontram decisões como as que seguem:
STJ - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL AgRg no REsp 1416041 RS 2013/0367980-2)
Data de publicação: 09/06/2014
Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC . COISA JULGADA. SÚMULA 211/STJ. NULIDADE DA CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS. PRECEDENTES. SÚMULAS 7/STJ E 283/STF. IMPROVIMENTO. 1.- Embora rejeitando os Embargos de Declaração, o acórdão recorrido examinou, motivadamente, todas as questões pertinentes, logo, não há que se falar em ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil . 2.- O prequestionamento, entendido como a necessidade de o tema objeto do recurso haver sido examinado pela decisão atacada, constitui exigência inafastável da própria previsão constitucional, ao tratar do Recurso Especial, impondo-se como um dos principais requisitos ao seu conhecimento. Não examinada a matéria acerca da ocorrência de coisa julgada pela instância a quo, mesmo com a oposição dos Embargos de Declaração, incide o enunciado 211 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça. 3.- Acessão de direitos hereditários deve ser formalizada por escritura pública, consoante determina o artigo 1.793 do Código Civil de 2002 . (REsp 1.027.884/SC, Relator Ministro FERNANDO GONÇALVES, Quarta Turma, DJe 24/08/2009).
STJ - RECURSO ESPECIAL REsp 1027884 SC 2008/0024996-6
Data de publicação: 24/08/2009
Ementa: CIVIL. CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS. ESCRITURA PÚBLICA. NECESSIDADE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADO. 1 - A cessão dedireitos hereditários deve ser formalizada por escritura pública, consoante determina o artigo 1.793 do Código Civil de 2002. 2 - Não há identidade fática entre os arestos apontados como paradigma e a hipótese tratada nos autos. 3 - Recurso especial não conhecido.
STJ -: Recurso Especial MS n. 1.196.992
Data de Julgamento: 06/08/2013  Data de Aprovação Data não disponível Data de Publicação:22/08/2013
Estado: Mato Grosso do Sul  Relator: Nancy Andrighi  Legislação: Arts. 108, 541, 1.793 e 1.806 do Código Civil.
Ementa
SUCESSÕES. RECURSO ESPECIAL. MEAÇÃO. ATO DE DISPOSIÇÃO EM FAVOR DOS HERDEIROS. DOAÇÃO. ATO INTER VIVOS. FORMA. ESCRITURA PÚBLICA. 1. Discussão relativa à necessidade de lavratura de escritura pública para prática de ato de disposição da meação da viúva em favor dos herdeiros. 2. O ato para dispor da meação não se equipara à cessão de direitos hereditários, prevista no art. 1.793 do Código Civil, porque esta pressupõe a condição de herdeiro para que possa ser efetivada. 3. Embora o art. 1.806 do Código Civil admita que a renúncia à herança possa ser efetivada por instrumento público ou termo judicial, a meação não se confunde com a herança. 4. A renúncia da herança pressupõe a abertura da sucessão e só pode ser realizada por aqueles que ostentam a condição de herdeiro. 5. O ato de disposição patrimonial representado pela cessão gratuita da meação em favor dos herdeiros configura uma verdadeira doação, a qual, nos termos do art. 541 do Código Civil, far-se-á por Escritura Pública ou instrumento particular, sendo que, na hipótese, deve ser adotado o instrumento público, por conta do disposto no art. 108 do Código Civil. 6. Recurso especial desprovido.
Diante destas e outras inúmeras decisões de Tribunais de Justiça Estaduais, sem entrar no mérito se a qualificação registral deve, ou pode, ou  examinar a formalização do contrato de cessão de direitos hereditários e de direitos de meação, resolvi por um pouco mais de lenha na fogueira na tentativa de se esclarecer o assunto.

A MEAÇÃO E A HERANÇA COMO DIREITOS À SUCESSÃO ABERTA.

Primeiro não se pode confundir sucessão com herança. A sucessão é o fato de alguém substituir outrem nos direitos e obrigações em função da morte, ao passo que herança é o conjunto de bens, direitos e obrigações que se transmitem em virtude da morte a uma pessoa ou várias pessoas, que sobreviveram ao falecido, também denominada espólio. Os bens, direitos e obrigações que se transmitem aos herdeiros no momento da morte é a herança. No entanto, se a pessoa falecida fora casada e existir um patrimônio composto de bens, direitos e obrigações que se comunicavam com o cônjuge supérstite, ou seja, pertenciam ao falecido e ao cônjuge sobrevivente em virtude do regime do casamento, a sucessão aberta é formada por direitos do cônjuge sobrevivente ou direitos de meação e direitos dos herdeiros ou direitos hereditários ou à herança. Então, se o falecido for casado em regime que haja comunicação de bens, direitos e obrigações, a sucessão aberta é formada por meação e herança, e conseqüentemente há direitos de meação e direitos hereditários, ambos suscetíveis de renúncia, cessão e penhora.
O legislador estabeleceu normas, quando a sucessão é aberta, tanto para estabelecer a vocação hereditária como para a forma de se partilhar os bens, sempre levando em conta a herança separada da meação. Os procedimentos para partilha, desde o inventário ou arrolamento e a partilha, ou adjudicação e outras questões de ordem processual, estão reguladas no Código de Processo Civil. No artigo 1.023, ao estabelecer regras para a partilha dos bens ficados pelo falecimento, determina que “primeiro deva ser atendidas as dívidas, depois separada à meação do cônjuge supérstite”, surgindo então a meação disponível, ou seja: a herança propriamente dita que será atribuída aos herdeiros relativamente aos seus direitos hereditários como quinhões, podendo permanecer em condomínio ou não, consoante disposição do artigo 2.019 do novo código, que estabelece que “os bens insuscetíveis de divisão cômoda, que não couberam na meação do cônjuge sobrevivente ou no quinhão de um só herdeiro, serão vendidos judicialmente, partilhando-se o valor apurado, a não ser que haja acordo para serem adjudicados a todos”. 
Relativamente ao direito à meação, sobre o qual não há referência do Código Civil de 1.916, o Novo Código de 2002 inova ao estabelecer no seu artigo 1.682 que “o direito à meação não é renunciável, cessível ou penhorável na vigência do regime matrimonial”. A motivação, provavelmente, se deve ao fato de que pelo diploma antigo não havia previsão de extinção do casamento pelo divórcio. Deste preceito legal se conclui que: extinto o casamento pelo divórcio, os bens, direitos e obrigações do casal, não partilhados, constituem direitos de meação e desta forma tais direitos podem ser renunciados, cedidos e penhorados. Só a partilha do patrimônio atribuirá obrigações, bens e direitos aos divorciados e, quanto aos bens imóveis, somente o registro da partilha os disponibilizará para venda ou qualquer outra forma de alienação.  Por isso entendo impossível o registro de imóvel correspondente a venda ou outra forma de alienação antes do registro da partilha, pois que somente esta extingue a comunhão matrimonial e somente o registro desta disponibiliza o bem para o respectivo meeiro.
Ao contrário do que estabelece o artigo 1.682, “extinto o regime matrimonial, o direito à meação é renunciável, cessível e penhorável”,  - a lei proíbe a renúncia, a cessão a penhora da meação na vigência do regime matrimonial - o direito à meação como o direito à herança podem ser objeto do contrato denominado cessão de direitos, podem ser renunciados e podem ser penhorados, desde que instrumentalizados na forma da lei. A morte de um dos cônjuges é forma de extinção de regime matrimonial.
Os novos preceitos que passaram a integrar o ordenamento civil pátrio a partir de 2002 nos informam dois requisitos básicos para a cessão de direitosquer de meação ou de herança na sucessão aberta, a saber: a)-  somente após a abertura da sucessão, ou seja, após a morte do autor da herança, poderemos falar em cessão dos respectivos direitos. Tanto no antigo ordenamento (art. 1.089), quanto no atual (art. 426) a herança de pessoa viva não pode ser objeto de 0contrato. Só com a abertura da sucessão a herança se transmite, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários, permanecendo, até o partilhamento final, o estado de indivisão, “como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros” (art. 1.791). b) a cessão deverá ser feita por escritura pública, ou seja, deverá ser feitas em notas do Tabelião.  
Por outro lado, a renúnciatanto dos direitos hereditários na sucessão aberta com dos direitos de meação na sucessão aberta e estes também dos resultantes da decretação por sentença judicial ou consolidação do divórcio por escritura pública, pode ser feita por termos judiciais ou instrumento público, no caso, escritura pública lavrada por Tabelião.
É de se salientar que embora a Lei 6.515/77, no seu artigo 31 estabelece que “não se decretará o divórcio se ainda não houver sentença definitiva de separação judicial ou se não tiver sido decidido sobre a partilha de bens”, a jurisprudência estabeleceu na súmula 197 do STJ a possibilidade da decretação do divórcio permanecendo o patrimônio do casal em condomínio até ulterior partilha.   Portanto, não existindo partilha, há um patrimônio comum constituído de bens, direitos e obrigações de ambos, no qual os divorciados (ou separados) possuem direitos de meação enquanto não realizada a partilha, pois que somente a partilha extingue o condomínio resultante do casamento.
Dizer que pela simples averbação da separação ou divórcio nas matrículas dos imóveis há mudança do caráter jurídico do patrimônio do casal passando a existir um condomínio ordinário onde cada ex-cônjuge tem 50% e, neste caso, viável a transmissão de 50% de um dos ex-cônjuges a terceiros ou ao outro ex-cônjuge sem a partilha, seria o mesmo que estabelecer-se que, com a morte de um dos cônjuges, averbando-se na matrícula o seu falecimento, o cônjuge supérstite e meeiro ou os herdeiros poderiam transmitir a terceiros seus respectivos 50% do imóvel sem a realização da partilha por uma das formas previstas em Lei, por compra e venda ou doação e efetuar-se o registro da alienação no Registro de Imóveis.
Para ambos os casos há previsão legal de partilha de bens resultante de procedimentos diferentes, mas com o mesmo fim: extinguir o condomínio matrimonial e disponibilizar os bens para quem forem atribuídos na partilha. O fato de que a partilha de bens não é mais obrigatória para a homologação do divórcio não significa que ela também deixou de ser obrigatória para extinguir o condomínio matrimonial e disponibilizar bens pertencentes aos ex-cônjuges em virtude da decretação da separação ou divórcio, ou solenização do divórcio por escritura pública.
Não há dúvida que sob a égide do Código Civil de 2002, pelo estabelecido no seu artigo 1.682, é impossível a alienação de qualquer imóvel, ou fração dele, sem o registro da partilha que disponibiliza para os ex-cônjuges por estar ferindo o diploma legal e os princípios da disponibilidade e da continuidade que regem os Registros Públicos.
As jurisprudências e pareceres que admitem o registro de escritura pública de compra e venda em que o outorgante vendedor transmite à ex-mulher ou a terceiros sua metade ideal de imóvel havido em comum, mesmo ausente a partilha de bens por ocasião da dissolução da sociedade conjugal, na sua maioria tem embasamento nas não disposições do Código Civil de 1916 a respeito do assunto. No entanto, hoje vão contra o que dispõe o artigo 1.682 do Código Civil 2002 e contra os princípios da disponibilidade e continuidade que regem os Registros Públicos. Não há qualquer dúvida que só a partilha extingue o condomínio matrimonial e somente o registro da partilha disponibiliza os bens que compõem a meação para sua alienação. Antes da partilha estamos tratando de direitos de meação, suscetíveis de renúncia ou cessão para adjudicação em partilha posterior. O disposto no artigo 1.682 é inovação do Código Civil de 2002 que inibe todos os pareceres e jurisprudência em sentido contrário.

A EXIGÊNCIA DA ESCRITURA PÚBLICA E A POSSIBILIDADE DE RENÚNCIA POR TERMO NOS AUTOS.

            O direito sucessório é regrado em livro especial do nosso ordenamento jurídico. Nas disposições gerais, no artigo 1784, estabelece que “aberta a sucessão” (no sentido de morte de uma pessoa), “a herança se transmite imediatamente aos herdeiros legítimos e testamentários”. É o princípio da saisine. Por ele, aberta a sucessão, os herdeiros têm a posse indireta de todos os bens que compõem o espólio do falecido como um todo unitário, assim permanecendo até a partilha. Até esta, “o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, será indivisível, e regular-se-á pelas normas relativas ao condômino” (artigo 1791 e seu parágrafo único).
A lei ainda estabelece regras para aceitação e renúncia da herança, presumindo aceitação definitiva pelo herdeiro e sua transmissão desde a abertura da sucessão, salvo se o herdeiro renunciar à herança, estabelecendo no artigo 1.806 a forma de fazê-lo: “a renúncia da herança deve constar expressamente de instrumento público ou termo judicial”. A lei estabelece, também, que “não se pode aceitar ou renunciar a herança em parte, condição ou a termo” (artigo 1.808).
Tratando do direito sucessório, o Código Civil atual prevê em seu artigo 1.793 que "o direito a sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública".  Os artigos anteriormente se referem à renúncia da herança. Neste se refere à cessão do direito à sucessão aberta e do seu quinhão hereditário. Aqui o legislador inovou eis que a cessão de direitos hereditários, bem como cessão dos direitos de meação, “contratos através dos quais se opera a transmissão de direitos provenientes de sucessão enquanto não dados a partilha que declarará a partição e deferimento dos bens da herança” (no sentido de espólio ou conjunto dos bens que integra o patrimônio deixado pelo de cujus, e que serão partilhados, no inventário), ao meeiro, aos herdeiros (legítimos ou testamentários) e aos cessionários, não encontrava dispositivo específico no Código Civil de 1916. Havia referência à cessão no artigo 1.078 do CCB/1916, segundo o qual, se aplicavam as disposições do título (cessão de crédito) sobre a cessão de outros direitos para os quais não havia modo especial de transferência. Outra menção ao instituto no diploma anterior se verificava no artigo 1.582 que preceituava a não presunção de aceitação da herança se procedida a cessão gratuita (renúncia) aos demais herdeiros.
A Lei estabelece que o direito à sucessão aberta (meação e herança) pode ser objeto de cessão. Mas determina. A cessão deve ser por escritura pública, escritura a ser lavrada por tabelião. Não tem outra forma de cessão de tais direitos.
Relativamente à renúncia da herança, o artigo 1581 do CC/1916, quando estipulava que a aceitação da herança podia ser expressa ou tácita, também determinava que a renúncia devesse constar expressamente de instrumento público ou termo judicial. Então a cessão de direitos hereditários, em suas várias formas, foi instrumento largamente utilizado no direito brasileiro sempre com base na doutrina. Ora se utilizava o termo nos autos para renúncia abdicativa e para renúncia translativa, esta como cessão dos direitos hereditários ou de meação. E ora era utilizada a escritura pública, por se tratado do direito à sucessão aberta como um direito real.  Como não se regrava a cessão de direitos à herança, a doutrina e a jurisprudência definiam as regras, determinado por vez a necessidade de escritura pública e por outras admitindo a cessão de direitos por termo nos autos, denominando-a de renúncia translativa. Na sua grande maioria, os doutrinadores concordavam com a existência de duas espécies de renúncia à herança. A renúncia abdicativa, ato em que o herdeiro renuncia à herança e não indica beneficiário, quando a herança é distribuída entre os demais herdeiros. E a renúncia translativa, quando o herdeiro renuncia a favor de beneficiário. A renúncia translativa na verdade é uma cessão de direitos “criada” pelos doutrinadores e confirmada pelos tribunais por falta de previsão legal no diploma antigo.
Por outro lado, passaram os doutrinadores e os tribunais a entenderem que para “cessão” dos direitos de meação havia necessidade de escritura pública por equiparar-se a compra e venda ou doação. Alguns Tabeliães passaram a lavrar escrituras públicas de venda ou doação de meação para solenizar a cessão de direitos relativos a meação. Tudo questão de nomenclatura eis que, na verdade, a escritura pública sob aqueles títulos solenizava a cessão dos direitos de meação por escritura pública, como determinava a legislação.
Não havia uma unanimidade nem na doutrina nem na jurisprudência, o que deve ter motivado o legislador de 2002 em contemplá-la – a cessão - em novos dispositivos. Para que a renúncia de direitos à sucessão aberta tenha eficácia, estabelece com requisito no artigo 1.806 seja procedida por instrumento público ou termo judicial. Já para que a cessão de direitos à sucessão aberta se opere legalmente, o artigo 1.793 estabelece como requisito a escritura pública, que é o instrumento público lavrado por Tabelião. No entanto, mesmo com a clareza dos dispositivos legais do nosso Código vigente, Tribunais de vários Estados vêm interpretando estes dispositivos de maneira contrária, com motivações diversas.
Entendo que tanto os direitos de meação com o os direitos hereditários, em inventário judicial, são renunciáveis – renúncia abdicativa – por termo judicial com amparo no artigo 1.806, eis que ambos são direitos à sucessão aberta, podendo também ser a renúncia objeto de escritura pública. Por outro lado, a cessão onerosa ou gratuita – cessão ou renúncia translativa – deve ser solenizada, independentemente de qualquer valor, por escritura pública, por determinação do artigo 1.793 do CCB.   Se os atos não estão formalizados na forma da lei, entendo que o registrador deve qualificar o documento negativamente para registro, mesmo que a partilha tenha sido homologada ou julgada por Juiz de Direito.

Leia mais: http://jus.com.br/artigos/30611/o-contrato-de-cessao-de-direitos-de-meacao-e-heranca#ixzz3K6gRVdWz

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