domingo, 31 de agosto de 2014

Doença do refluxo gastroesofágico na literatura cirúrgica versus literatura clínica: clínicos não leem revistas cirúrgicas



Fernando A M HerbellaI; Daniel SzorI; Guilherme F TakassiI; Jose C Del GrandeI; Marco G. PattiII
IDepartmento de Cirurgia, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
IIDepartment of Surgery, University of Chicago, Chicago, Il, USA



RESUMO
RACIONAL: Várias doenças podem ser tratadas médica ou cirurgicamente; no entanto, a terapêutica clínica ou cirúrgica não é muitas vezes usada como diferente opção para o mesmo paciente, mas sim como diferente filosofia médica na abordagem.
OBJETIVO: Verificar se os principais periódicos cirúrgicos e clínicos fazem referências aos seus congêneres, tendo a doença do refluxo gastroesofágico como um modelo de doença clínico/cirúrgica.
MÉTODO: Foram revistos os cinco primeiros periódicos classificados na área de gastroenterologia, cirurgia geral e medicina geral e um jornal neutro. Os números do ano 2008 dos periódicos selecionados foram pesquisados no como lidar com a doença do refluxo gastroesofágico.
RESULTADOS: Foram selecionados 49 trabalhos, 36 (74%) em revistas clínicas, 5 (10%) em revistas de cirurgia, 2 (4%) em revistas de medicina geral e 6 (12%) no jornal neutro. Trinta e um (63%) tiveram origem clínica, 13 (26%) cirúrgica, e 5 (10%) a origem foi neutra. Revistas cirúrgicas publicaram apenas artigos cirúrgicos e revistas de medicina geral, publicaram apenas trabalhos clínicos. Revistas e jornais de medicina clínica geral mostraram maior proporção de referências clínico/cirúrgicas em relação às revistas de cirurgia (p<0,001) e do jornal neutro (p<0,001). Não houve diferenças na proporção de referências clínico/cirúrgicas quando revistas cirúrgicas e a neutra foram comparadas (p= 0,06). Revistas clínicas e de medicina geral mostraram semelhante proporção de referências clínico/cirúrgicas (p=0,06).
CONCLUSÃO: Os clínicos fazem referências significativamente menores para revistas cirúrgicas do que os cirurgiões fazem para as revistas clínicas.
Descritores: Cirurgia. Gastroenterologia. Refluxo gastroesofágico.



INTRODUCÃO
As diferenças entre os cirurgiões e os médicos vão muito além da beleza de sua arte8. Várias doenças podem dispor de terapia clínica ou cirúrgica como um tratamento aceitável. Em muitos casos, no entanto, a terapia médica e cirúrgica não é tratada como diferente opção para o mesmo paciente, mas sim como duas diferentes filosofias médicas. Além disso, parece que muitas vezes os cirurgiões e os médicos não discutem os mesmos trabalhos e, também, eles não estão cientes de pesquisas recíprocas.
O objetivo deste artigo é revisar os principais periódicos médicos, a fim de verificar se os cirurgiões e os clínicos fazem referências às suas congêneres em seus estudos sobre a doença do refluxo gastroesofágico escolhida como um modelo de doença clínico/cirúrgica.

MÉTODO
Foram revistos os cinco primeiros periódicos classificados na área de gastroenterologia, cirurgia geral e medicina geral. Revistas foram selecionadas com base no número de citações de acordo com o fator de impacto ISI Web of Knowledge para 2007. Revistas altamente especializados, como aquelas dedicados exclusivamente à hepatologia, endoscopia, cirurgia vascular, etc, foram excluídas da análise. Além disso, revista editada por cirurgiões e clínicos foi incluída como neutra. Os periódicos selecionados estão listados na Tabela 1.


Os números do ano 2008 dos periódicos selecionados foram pesquisados procurando artigos que versavam sobre a doença do refluxo gastroesofágico. Cartas ao editor, editoriais, relatos de casos e resumos de reuniões foram excluídos da análise. A origem do trabalho foi classificada como "clínico" ou "cirúrgico", baseado no departamento que originou a investigação. Origem neutral referia-se a periódico proveniente de diversos departamentos, como doença ou um estudo conjunto entre cirurgiões e clínicos. As referências desses trabalhos foram classificados como "clínica", "cirúrgica", ou "neutra" de acordo com o jornal onde ele foi publicado. Revistas clínicas foram definidas como aquelas classificadas como de gastroenterologia & hepatologia no Journal of Citation Report pelo ISI Web of Knowledge. Da mesma forma, as revistas cirúrgicas foram definidas como aquelas classificadas como cirurgia. Outros jornais ou os que figuram em ambas as classificações foram definidas como neutras.
Aprovação ética não foi necessária para este estudo.
O teste de Fisher foi usado para comparação estatística entre os grupos.

RESULTADOS
A pesquisa nos periódicos selecionados obteve 49 trabalhos, 36 (74%) em revistas clínicas, 5 (10%) em revistas de cirurgia, 2 (4%) em revistas de medicina geral e 6 (12%) em revista neutra. De acordo com a origem, 31 (63%) tiveram origem clínica, 13 (26%) cirúrgica, e em 5 (10%) a origem foi neutra. Revistas cirúrgicas publicaram apenas artigos cirúrgicos e revistas de medicina geral, publicaram apenas trabalhos clínicos (Tabela 2).


Referências dos trabalhos selecionados estão dispostas na Tabela 3. Revistas e jornais de medicina clínica geral mostraram maior proporção de referências clínicas e cirúrgicas em relação às revistas de cirurgia (p<0,001) e da revista neutra (p<0,001). Não houve diferenças na proporção de referências clínico/cirúrgicas quando as neutras foram comparadas (p=0,06). Da mesma forma, jornais e revistas clínicas e de medicina geral, mostraram proporção semelhante de referências clínico/cirúrgicas (p=0,06).


DISCUSSÃO
As revistas são consideradas uma das fontes mais importantes na transmissão dos resultados da investigação e como um guia para a prática clínica para médicos3 e cirurgiões1,7. É intuitivo acreditar que os clínicos são mais propensos a lerem jornais clínicos e cirurgiões para lerem revistas cirúrgicas. Isso pode ser explicado por interesses pessoais e da acessibilidade para as revistas, uma vez que eles geralmente estão disponíveis para membros de organizações profissionais e das sociedades. Contudo, o nível de leitores não é sinônimo de ordem de importância1. Além disso, os relatórios científicos devem estar livres de parcialidade e preconceitos. Pesquisas anteriores mostraram que os cirurgiões leem revistas clinicas1,4,7, mas o interesse de clínicos em revistas cirúrgica não foi investigado.
Aqui, foram pesquisadas as referências de trabalhos clínicos e cirúrgicos para determinar se os cirurgiões e clínicos a fazer referências a seus pares.
A doença do refluxo gastroesofágico foi utilizada como modelo nesta pesquisa devido ao fato de que os tratamentos clínico e cirúrgico são amplamente disponíveis, aceitáveis e eficientes5. Além disso, os cirurgiões estão familiarizados com a pesquisa básica e estudos de fisiopatologia, e atualmente realizam testes de diagnóstico, tratamento clínico e intervenções terapêuticas endoscópicas em adição à cirurgia2.
Esta análise mostrou que os clínicos fazem referências significativamente menor para revistas cirúrgicas do que os cirurgiões fazem às revistas clínicas. Curiosamente, as revistas de medicina geral apresentaram comportamento similar em relação às revistas clínicas. A revista neutra é mais mente aberta em relação às referências para trabalhos clínicos e cirúrgicos.

CONCLUSÃO
Os cirurgiões devem ser incentivados a publicar em revistas clínicas, a fim de divulgar a pesquisa cirúrgica6. Revistas neutras podem ser uma forma imparcial para suas publicações.

REFERÊNCIAS
1. Jones TH, Hanney S, Buxton MJ. The journals of importance to UK clinicians: a questionnaire survey of surgeons. BMC Med Inform Decis Mak. 2006;6:24.         [ Links ]
2. Luketich JD, Pennathur A. How to Keep the Treatment of Esophageal Disease in the Surgeon's Hands. Ann Thorac Surg 2008; 85:S760-3.         [ Links ]
3. McKibbon KA, Haynes RB, McKinlay RJ, Lokker C. Which journals do primary care physicians and specialists access from an online service? J Med Libr Assoc. 2007;95(3):246-54.         [ Links ]
4. Mcleod DAD. BMJ is second most popular journal among surgeons. BMJ 1998; 316:1164.         [ Links ]
5. Moayyedi P, Talley NJ. Gastro-oesophageal reflux disease. Lancet. 2006 ;367(9528):2086-100.         [ Links ]
6. Schein M, Fingerhut A. Where can surgeons publish? Br J Surg. 2000;87(3):261-4.         [ Links ]
7. Schein M, Paladugu R, Sutija VG, Wise L. What American surgeons read: a survey of a thousand Fellows of the American College of Surgeons. Curr Surg. 2000 ;57(3):252-258.         [ Links ]
8. Trilla A, Aymerich M, Lacy AM, Bertran MJ. Phenotypic differences between male physicians, surgeons, and film stars: comparative study. BMJ. 2006 333(7582):1291-3.         [ Links ]


 Correspondência:
Fernando A. M. Herbella,
e-mail: herbella.dcir@epm.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário