domingo, 15 de junho de 2014

Asma na gestação: efeitos na vitalidade fetal, complicações maternas e perinatais




Renata Franco Pimentel MendesI; Roseli Mieko Yamamoto NomuraII; Cristiane OrtigosaII; Rossana Pulcineli Vieira FranciscoII; Marcelo ZugaibII
IFaculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil
IIDepartamento de Obstetrícia e Ginecologia, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil



RESUMO
OBJETIVO: Avaliar os efeitos da asma materna sobre a gravidez, analisando as repercussões da gravidade da doença no comprometimento do bem-estar fetal, bem como as complicações maternas e perinatais associadas.
MÉTODOS: Foi realizado estudo retrospectivo de 117 gestações complicadas pela asma materna e sem outras comorbidades, no período de janeiro de 2005 a dezembro de 2010. Os critérios de inclusão foram: gestação única; diagnóstico de asma prévio à gestação; início do pré-natal antes da 28ª semana de gravidez; parto realizado na instituição; peso do recém-nascido acima de 500g e idade gestacional no parto acima de 22 semanas; ausência de malformações fetais ou anomalias cromossômicas; ausência de comorbidades maternas. A gravidade da asma foi classificada em intermitente, persistente leve, persistente moderada, persistente grave. Foram analisados os resultados do perfil biofísico fetal e da dopplervelocimetria de artéria umbilical realizados até 14 dias antes do parto.
RESULTADOS: Do total de 117 gestantes asmáticas analisadas: 41 (35,0%) eram intermitentes, 33 (28,2%) persistentes leves, 21 (17,9%) persistentes moderadas e 22 (18,8%) persistentes graves. Não houve diferença significativa entre os grupos quanto ao tipo de parto: a cesárea foi realizada em 65,8% dos casos, a corticoterapia materna no momento do parto em 20,5%, a idade gestacional no parto apresentou média de 38,6 semanas (DP 1,9 semanas) e o peso ao nascimento apresentou média de 3056 g (DP 581 g). O perfil biofísico fetal realizado no período anteparto (n = 90, 76,9%) apresentou resultado normal (8 ou 10) em 99% dos casos. A dopplervelocimetria de artéria umbilical foi avaliada em 23,9% (n = 28) das gestantes, e apresentou-se normal em 100% dos casos. O uso de corticoterapia sistêmica foi significativamente (p< 0,001) diferente entre os grupos intermitente (4,9%) e persistente leve (9,1%), persistente moderada (28,6%), persistente grave (45,5%). quanto ao início do parto, houve maior proporção de cesárea eletiva no grupo com asma persistente moderada (52,5%) e persistente grave (54,6%) quando comparados aos grupos intermitente (21,9%) e persistente leve (24,2%) (p = 0,039).
CONCLUSÃO: A gravidade da asma materna não parece influenciar diretamente os resultados perinatais e não compromete a vitalidade fetal. A conduta ativa proporcionando melhor quadro clínico materno promove evolução favorável para a gestação complicada pela asma.
Palavras-chave: Gestação; Feto; Asma; Cesárea; Assistência perinatal



Introdução
Na literatura são descritas diferentes taxas de prevalência de asma na gravidez. Em países como o Canadá, a asma afeta apenas 0,43% das mulheres grávidas,1 enquanto que em países como os Estados Unidos esta taxa pode chegar a 8,4%.2 No Brasil, apesar de não haver muitos estudos sobre o assunto, estima-se que a prevalência de asma na população se aproxime mais dos padrões americanos, variando de 5% a 8%.3
As pesquisas sobre os resultados perinatais na gestação complicada pela asma demonstram maior morbidade4,5perinatal, mas poucos estudos relacionam a gravidade da asma materna com o comprometimento do bem-estar fetal. Em estudo publicado em 1992, o sofrimento fetal foi indicação de cesárea em 25% dos casos analisados.6 A asma é uma patologia que se caracteriza por sintomas intermitentes ou contínuos de broncoconstrição; incluindo dispneia, sibilos, tosse, sensação de opressão torácica. O diagnóstico é obtido analisando-se a resposta a broncodilatador obtida através da espirometria. Clinicamente pode ser classificada como intermitente, persistente leve, moderada ou grave de acordo com os tipos e frequência de sintomas apresentados pela paciente e com os resultados obtidos nos exames respiratórios.
A asma na gestação é considerada um fator de alto risco para a gestante e para o feto. Os estudos controlados avaliaram que há aumento significativo do risco de complicações em gestantes asmáticas, principalmente naquelas mal controladas.7,8 Estas complicações incluem: prematuridade,9,10 baixo peso ao nascer,11 pré-eclampsia,12,13 maior proporção de parto pela cesárea,14 e maior morbidade perinatal.5
Algumas hipóteses foram levantadas para explicar tais complicações. São elas: 1) etiologia comum para hiperatividade dos músculos uterinos e brônquicos; 2) hipóxia secundária a asma materna; 3) mediadores bioativos liberados durante uma crise de asma; 4) medicações utilizadas para tratar asma durante a gravidez.15
No presente estudo, é apresentada a experiência no seguimento pré-natal de gestações complicadas pela asma materna, que tem como objetivo avaliar os seus efeitos sobre a gravidez, analisando as repercussões da gravidade da doença no comprometimento do bem-estar do feto, isto é, comprometimento na sua oxigenação, bem como as complicações maternas e perinatais associadas.

Métodos
Este trabalho foi realizado em Hospital Universitário, de nível terciário, que atende a gestações de alto risco. O estudo é do tipo retrospectivo e descritivo, adotando-se os seguintes critérios de inclusão: gestantes com diagnóstico de asma prévio à gestação; gestação única; início do pré-natal antes da 28ª semana de gravidez; parto realizado nesta instituição; peso do recém-nascido acima de 500 g e idade gestacional no parto acima de 22 semanas; ausência de malformações fetais ou anomalias cromossômicas; ausência de comorbidades maternas; e acompanhamento pré-natal no setor especializado de Pneumopatias e Gestação do Pré-natal no período de janeiro de 2005 a dezembro de 2010. O projeto de pesquisa foi aprovado pela comissão de ética em pesquisa da instituição sob o número 745/10.
As pacientes foram selecionadas e os dados coletados incluíram informações obtidas por meio de consulta aos prontuários médicos e livros de registro de partos, arquivados na seção de arquivo médico da instituição, bem como informações obtidas a partir da consulta ao banco de dados informatizado do departamento.
Foram avaliadas 117 gestações complicadas pela asma materna e os dados referentes às características da população estão apresentados na Tabela 1. A classificaçãodagravidade da asma foi baseada no protocolo assistencial adotado na instituição.16 Dessa forma, a asma foi classificada em intermitente, persistente leve, persistente moderada ou persistente grave. Essa classificação se baseia nos seguintes parâmetros: frequência dos sintomas diários, frequência de sintomas noturnos, variabilidade do pico expiratório máximo (PEF) e volume expiratório forçado no primeiro segundo (FEV1). Foram classificadas como asma intermitente as pacientes que apresentavam sintomas diários até duas vezes por semana, sintomas noturnos até duas vezes por mês, FEV1 >80% do previsto e/ou variabilidade do PEF menor que 20%. As pacientes classificadas como persistente leve apresentavam sintomas diários três ou mais vezes por semana e menos de uma vez ao dia, sintomas noturnos três ou mais vezes por mês, FEV1 > 80% do previsto e/ou variabilidade do PEF entre 20 e 30%. As classificadas como persistentes moderadas apresentavam sintomas diários, sintomas noturnos duas ou mais vezes por semana, FEV1 entre 60 e 80% do previsto e/ou variabilidade do PEF maior que 30%. E, por último, foram consideradas persistentes graves as que tinham sintomas diários contínuos, sintomas noturnos frequentes, FEV1 < 60% e/ou variabilidade do PEF maior que 30%.16


O bem-estar fetal foi avaliado por meio da cardiotocografia anteparto, perfil biofísico fetal (PBF) e dopplervelocimetria das artérias umbilicais. As pacientes realizaram os exames no mesmo período em que foram agendadas para a consulta de pré-natal, no terceiro trimestre da gestação. Para a presente pesquisa foram analisados os resultados da última avaliação realizada até duas semanas antes do parto. Pela ultrassonografia foram avaliados os parâmetros do PBF (tônus, movimentos corpóreos fetais, movimentos respiratórios fetais e volume de líquido amniótico). Foi utilizado equipamento de ultrassonografia da marca Toshiba®, modelo SSA-220ª, e Philips®, modelo Envisor; e aparelho de cardiotocografia da marca Hewllet-Packard®. Os resultados da cardiotocografia foram classificados conforme o protocolo do Serviço, que compreende a designação de feto ativo, considerado normal, quando otraçado demonstra pelo menos duas acelerações transitórias de 15 bpm de amplitude em até 30 minutos de traçado, FCF basal entre 110 e 160 bpm, variabilidade acima de 5 bpm e ausência de desacelerações. Os fetos com traçados cardiotocográficos anormais foram designados como feto hipoativo e feto inativo. O volume do líquido amniótico foi avaliado pelo índice de líquido amniótico (ILA). Seus valores foram classificados como normais quando superiores a 5,0cm. Para a execução dadopplervelocimetriadas artériasumbilicais a insonação do segmento do cordão umbilical foi próximo à inserção placentária e na ausência de movimentos corpóreos e respiratórios fetais. Considerou-se satisfatória a obtenção de pelo menos três sonogramas contendo, no mínimo, cinco ondas uniformes. Foram calculados os índices A/B (relação sístole/diástole) e índice de pulsatilidade (IP). Os valores obtidos foram comparados à curva de normalidade para este vaso.17
Foram investigadas as seguintes informações clínicas, obstétricas e perinatais: complicações respiratórias no 2º e 3º trimestres, necessidade de corticoterapia sistêmica durante a gestação, corticoterapia sistêmica no momento do parto, complicações obstétricas, tipo de parto, modo como se deu o início do parto (início por trabalho de parto espontâneo, por indução do trabalho de parto ou por cesárea eletiva), complicações no parto ou pós-parto (atonia uterina, infecções, exacerbação da asma), a idade gestacional no parto, peso do recém-nascido e adequação, sexo do recém-nascido e índices de Apgar de 1º e5º minutos.
A idade gestacional foi calculada a partir da data da última menstruação (DUM), quando era compatível com a idade gestacional estimada pela ultrassonografia realizada, no máximo, atéa20ª semanadegestação.Noscasosemquenãofoiobservada tal concordância, a idade gestacional foi calculada pelos dados da primeira ultrassonografia. O peso do recém-nascido, em gramas, aferido na sala de parto, foi comparado à curva de normalidade de Alexander et al.,18 de forma que foram classificados como pequenos para a idade gestacional aqueles com o peso inferior ao 10º percentil da faixa correspondente.
Os resultados foram analisados utilizando-se o programa Medcalc (Medcalc, versão 11.5.1.0). As variáveis categóricas foram analisadas descritivamente, calculando-se frequências absolutas e relativas. Para análise das variáveis contínuas, os resultados foram expressos em médias e desvios-padrão. Para comparação entre proporções foi aplicado o teste de Qui quadrado e, quando pertinente, o teste exato de Fisher. Foi utilizado o teste ANOVA para comparação das médias entre os grupos, nas variáveis com distribuição normal e o teste de Kruskal-Wallis para as variáveis de distribuição não normal. Foi adotado como nível de significância o valor 0,05 (alfa = 5%). Com isso, níveis descritivos (p) inferiores a esse valor foram considerados significantes (p< 0,05).

Resultados
Um total de 117 gestações complicadas pela asma materna foi incluído na presente casuística. As características maternas, os dados do parto e os resultados perinatais estão apresentados na Tabela 1. Quanto à distribuição dos casos de acordo com a gravidade da doença, nota-se maior proporção de casos classificados como intermitentes. Os casos de asma grave corresponderam a 19% da amostra e apenas uma paciente desse grupo necessitou ser internada em unidade de terapia intensiva (UTI) pela exacerbação da doença. A complicação obstétrica mais frequente foi a restrição de crescimento fetal, suspeitada no período antenatal em 12% dos casos. Quanto ao tipo de parto, a cesárea foi a mais frequente (65,8%). No pósparto, houve exacerbação da doença em 8,6% das pacientes.
Do total de casos estudados, 90 (76,9%) gestantes foram submetidas à avaliação da vitalidade fetal no período anteparto. Os resultados estão apresentados na Tabela 2. A cardiotocografia apresentou resultado normal (feto ativo) na maioria dos casos, o mesmo ocorrendo com o perfil biofísico fetal. O diagnóstico de oligo-hidrâmnio ocorreu em quatro de 90 casos (4,4%). A dopplervelocimetria das artérias umbilicais apresentou resultado normal em todos os casos em que este exame foi realizado (n = 28, 23,9%).
Tabela 3 apresenta a comparação dos principais parâmetros estudados nos diferentes grupos, categorizados de acordo com a gravidade da asma materna. Durante o pré-natal, as complicações respiratórias ocorreram de forma semelhante nos grupos analisados. No segundo e terceiro trimestres, essas complicações foram observadas, pelo menos, em 30% dos casos em cada grupo. A necessidade de corticoterapia materna durante o pré-natal foi significativamente diferente nos grupos estudados, com maior uso do corticoide sistêmico nos grupos de gestantes com asma persistente moderada e persistente grave. A análise dos dados quanto ao início do parto nos diferentes grupos demonstra que a cesárea eletiva foi mais frequentemente indicada nos casos com maior gravidade e, em contrapartida, o trabalho de parto espontâneo ocorreu com mais frequência nos casos de asma intermitente e persistente leve. No entanto, quando é analisado o tipo de parto que efetivamente ocorreu, verifica-se elevadaproporçãodecesáreasemtodososgrupos.Não houve diferença quanto à ocorrência de sofrimento fetal no trabalho de parto. O uso de corticoide sistêmico no período intraparto mostrou diferença significativa entre os grupos, sendo mais frequente no grupo com asma persistente grave. Não se constata diferença quanto aos resultados perinatais nos grupos estudados.

Discussão
A ocorrênciade complicações perinatais emgestações impactadas pela asma não diferiu de forma significativa entre os grupos categorizados pela gravidade da doença materna. No entanto, verificou-se que, nos casos de maior gravidade, houve maior proporção de casos em que a cesárea eletiva foi realizada antes do início do trabalho de parto, para a resolução da gestação, o que pode ter contribuído para proporcionar resultados perinatais semelhantes em todos os grupos analisados.
Existem resultados conflitantes sobre o impacto da asma na gestação. Estudos indicam associação da doença a recém nascidos PIG ou de baixo peso, além da prematuridade,5,9-11,14 principalmente relacionada à gravidade da doença. Entretanto, em metanálise realizada por Murphy et al.,4 não se verifica aumento do risco para esses eventos adversos. O presente estudo também não verificou associação entre a gravidade da asma e resultados perinatais adversos, com preservação da vitalidade fetal, o que pode ser explicado, em parte, pelo controle da doença materna e pela conduta ativa optada com a resolução da gravidez. A restrição de crescimento fetal foi constatada em 11,9% dos casos, apesar de não ter se detectado casos com anormalidade no Doppler da artéria umbilical. O mecanismo pelo qual ocorre a redução do crescimento fetal não está plenamente estabelecido. A fisiologia placentária parece ser modificada na gestação complicada pela asma materna pela menor atividade da enzima 11-betahidroxiesteroide desidrogenase do tipo 2 em gestações com fetos femininos.19 Essa enzima parece exercer efeito protetor ao feto frente ao excesso de glicocorticoides maternos, e influencia o crescimento fetal.20Estudos prospectivos abordando as alterações no fluxo placentário e alterações na expressão enzimática na placenta talvez esclareçam esses aspectos.
Nos casos em que se avaliou a vitalidade fetal pelo perfil biofísico, apenas um apresentou resultado suspeito no período anteparto. Também não se constatou diferença na proporção de casos que evoluíram com sofrimento fetal intraparto, nos grupos formados de acordo com a gravidade da asma materna. Em estudo que comparou a cardiotocografia anteparto em gestações de termo de pacientes asmáticas com gestantes sem comorbidades, não se constatou diferença significativa nos parâmetros da FCF, mas houve diferença nos padrões da movimentação fetal, indicando que a contagem de movimentos fetais pode ser um método útil na avaliação do bem-estar fetal.21 A cesárea foi realizada em 66% dos casos, proporção maior que a descrita em gestações de alto risco deste serviço (57%).22
Quanto às complicações respiratórias durante o pré-natal, estas podem ser decorrentes do descontrole da doença pelo aumento da pressão intrabdominal, além do maior consumo de oxigênio pelo organismo materno.23 O tratamento da asma é baseado, principalmente, em corticoide inalatório. E, quando há agravamento do quadro clínico, ajustam-se as doses de corticoide inalatório, e também é possível a associação com outros medicamentos, como beta agonistas de longa duração e corticoides sistêmicos orais, para melhor controle do quadro. Já nos quadros intermitentes ou exacerbações, oxigenação e beta agonista de curta duração são os mais utilizados. Nos casos de crises mais graves e mal controladas, a conduta pode ser a prescrição de corticoide oral.20
A incidência de pneumonia na gestação não parece diferir da população em geral de mulheres não grávidas. Entretanto, a asma pode ser fator predisponente, pois essa doença materna é relatada em 46,4% dos casos em que a pneumonia foi diagnosticada na gravidez.24 Na presente casuística, a pneumonia foi relatada em 9,4% dos casos analisados.
Há estudos mostrando que, na gestação, o tratamento medicamentoso da asma não acarreta efeitos adversos na própria gestante e no feto, beneficiando o binômio materno fetal com o controle da doença.9,13,14 No presente estudo, a corticoterapia materna no pré-natal foi utilizada em maior proporção de casos do grupo com asma grave, o que pode ter contribuído para o melhor controle da doença materna e o melhor resultado perinatal. De forma semelhante, Dombrowski et al.14 não encontram diferença estatisticamente significativa para complicações perinatais, exceto sepse neonatal, e complicações maternas entre gestantes não asmáticas e gestantes asmáticas, mas verificam diferença significativa no que diz respeito à incidência de partos cesáreos.
A asma é doença de curso mutável que pode apresentar variações quanto à sua gravidade. Portanto, o médico deve estar sempre atento aos parâmetros clínicos e funcionais. Se a gestante se apresentar com a asma controlada por mais de três semanas, a medicação deve ser reduzida. Mas quando a doença encontra-se parcialmente controlada, não controlada ou com exacerbações, o aumento da medicação deve ser considerado. A descontinuidade do tratamento durante a gravidez pode contribuir para a piora do quadro materno, e isso é relatado em estudo de Lim et al.,25 em que 25,8% dos profissionais do estudo diminuiriam ou interromperiam as medicações de uso prévio, mesmo em crise asmática. Em nosso estudo, as pacientes tiveram suas medicações ajustadas quando houve descontrole da doença, além de serem orientadas quanto às medidas ambientais, como: evitar contato com pólens, bolores, ácaros, sensibilizantes ocupacionais, ar frio, exercícios, infecções respiratórias e fumo. Portanto, o presente estudo demonstra que o beneficio de ter a asma controlada durante a gestação supera qualquer possível malefício advindo das medicações utilizadas para controlar a doença.
Apesar dos esforços realizados para manter a asma controlada, exacerbações podem ocorrer. Há diversos fatores que podem deflagrá-la, como interrupção do uso da medicação, exposição a alérgenos, estresse e infecção do trato respiratório. Apesar de a prevenção apresentar-se como a conduta mais adequada para evitar os quadros de exacerbações, Schatz eal.26 notam que 52% das pacientes com asma grave apresentam exacerbação da doença durante a gravidez, e muitas necessitam de hospitalização.
Portanto, é essencial que os obstetras reconheçam, conduzam e tratem adequadamente os casos graves.27 As estratégias de tratamento baseiam-se em oxigenação suplementar, de modo que a saturação permaneça acima de 95%, beta agonista de curta duração e corticoesteroides, prevenção e correção da hipoxemia ou redução da hipercapnia.28 Na presente casuística, nenhuma gestante apresentou refratariedade ao tratamento clínico da asma que indicasse necessidade de resolução pela cesárea de urgência.
A melhora do quadro de exacerbação da asma grave após o parto resulta de dois fatores concomitantes: diminuição da pressão intrabdominal e diminuição do consumo de oxigênio.29 O manejo do parto de pacientes asmáticas deve ser cauteloso, mesmo na ausência de exacerbações. As medicações de uso contínuo para controle da doença não devem ser postergadas ou retiradas devido ao trabalho de parto. Neste estudo, as pacientes que apresentaram exacerbação foram medicadas com corticoide sistêmico no momento do trabalho de parto e no parto. Apenas uma gestante com asma grave necessitou de suporte em Unidade de Terapia Intensiva por sete dias, e o parto foi realizado com anestesia geral.
As limitações desta pesquisa referem-se ao número limitado de casos com avaliação pela dopplervelocimetria e à dificuldade na obtenção de informações pela característica retrospectiva do trabalho. Além disso, verificou-se a impossibilidade de obtenção de um grupo-controle de gestantes não portadoras de asma, para o mesmo período do estudo, tendo em vista que o presente serviço caracteriza-se por atender prioritariamente gestações de alto risco.

Conclusão
A gravidade da asma materna não parece influenciar diretamente nos resultados perinatais e não compromete a vitalidade fetal. Apesar de a exacerbação de asma durante a gravidez não estar relacionada à gravidade da doença, a asma mal controlada durante a gravidez pode ser um risco para desfecho perinatal adverso. A conduta ativa proporcionando melhor quadro clínico materno promove evolução favorável para a gestação complicada pela asma.

Suporte financeiro
Bolsa de iniciação científica da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) para a aluna Renata Franco Pimentel Mendes.

Conflito de interesses
Os autores declaram não haver conflito de interesses.

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 Autor para correspondência:
Roseli Mieko Yamamoto Nomura
Departamento de Obstetrícia e Ginecologia, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar 255, 10º andar, sala 10037
São Paulo, SP, 05403-000, Brasil 

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